O poder do silêncio - Mina
 
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O poder do silêncio

A paz que você busca pode estar no silêncio que você não faz – ou que não te deixam fazer. A professora de yoga Luciana Guerin faz sua defesa desse aliado poderoso do bem-estar.

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Enquanto escrevo esta matéria, o barulho de mais um prédio subindo na vizinhança segue firme e forte. O barulho tira o nosso foco, bem-estar e saúde. Causa desassossego, irritação, pode agravar sintomas relacionados a ansiedade e estresse. E nos coloca para longe de nós mesmos. Em contrapartida, o silêncio tem propriedades calmantes e curativas. Diminuir os ruídos ao nosso redor traz impactos positivos para o corpo e para a mente.

“Nós precisamos de silêncio assim como precisamos de ar”

A ciência tem se interessado cada vez mais pela dimensão terapêutica do silêncio. Estudos mostram que o silêncio ajuda a controlar a pressão arterial, reduz o risco de problemas cardiovasculares, melhora o sono, é um aliado contra a ansiedade e a depressão.  Ficar em silêncio pode ainda levar ao crescimento de novas células cerebrais no hipocampo, região do cérebro relacionada ao aprendizado, à memória e às emoções, afirmam alguns pesquisadores.

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A vida moderna é barulhenta. Acústica, visual e mentalmente. A hiperconectividade e o excesso de informações nos sufocam, deixando pouco espaço para a quietude. Especialmente a vida de quem vive nos grandes centros urbanos. É o celular, a televisão, o trânsito, a música alta, as conversas espalhafatosas, os canteiros de obras.

Mas essa poluição sonora é bastante prejudicial para a nossa saúde – e não estou falando apenas de problemas auditivos. Para se ter ideia, um relatório da OMS, publicado em 2011, mostrou que 3.000 mortes ocorridas naquele ano, na Europa Ocidental, por doença cardíaca, tinham relação com o ruído excessivo. Mais um exemplo do por que dar espaço ao silêncio se faz importante. 

É por meio do exercício de silenciar que muitas pessoas tornaram-se sábias e, em várias linhas do pensamento místico, religiões e escolas de autoconhecimento, o silêncio tem lugar de destaque. Rumi, o místico islâmico sufista, escreveu: “O silêncio é a linguagem de Deus, todo o resto é má tradução”.

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O monge vietnamita Thich Nhat Hanh, um dos mais respeitados mestres do zen-budismo e autor do livro Silêncio: o poder da quietude num mundo barulhento, também faz sua defesa. “Nós precisamos de silêncio assim como precisamos de ar, da mesma maneira que as plantas precisam de luz. Se nossas mentes estão repletas de palavras e pensamentos, não há espaço para nós”.  

Ainda assim, a maioria de nós teme o silêncio. O dia a dia ruidoso tornou-se uma espécie de rota de fuga de nós mesmos. E também uma tentativa de escapatória do tédio e da solidão. Não tem cena melhor para ilustrar do que a da televisão ligada sem ninguém assistindo ou a música sempre de fundo. O silêncio assusta. Mas, quando conseguimos nos entregar a ele, abrimos espaço para experimentar o seu poder. Ele é capaz de nos transformar. Serve para serenar a mente – e é vital para a nossa criatividade. 

Eu preciso do silêncio. Ele é vital pro meu equilíbrio. É prazeroso. É terapêutico. Acho que sempre fui de ouvir mais e falar menos. E depois de ficar muito tempo num lugar barulhento, invariavelmente, precisei da quietude para compensar. Mas foi com a chegada do yoga na minha vida que a importância do silêncio se tornou mais clara para mim. Mesmo em grupo, a prática de yoga promove um saudável distanciamento do diálogo mental incessante, nos conduzindo em direção ao nosso silêncio interior. E o resultado disso é sempre bom. Ficar em silêncio me acalma, traz bem-estar, ajuda a me organizar internamente e possibilita vários insights.

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Alguns buscam o silêncio na natureza. Outros em retiros. Existem até spas de silêncio. E vem aumentando a oferta de destinos turísticos que exaltam o silêncio como seu maior tesouro, um verdadeiro luxo. “Vir para a Finlândia é descobrir pensamentos e sentimentos que não são audíveis numa vida agitada. Se você quiser conhecer a si mesmo, você tem de estar consigo mesmo, discutir com você mesmo, ser capaz de falar com si mesmo”. A fala é de Noora Vikman, etnomusicóloga da Universidade da Finlândia, que assessorou o Instituto de Turismo do país na campanha do silêncio como atrativo turístico.

“O ruído nos leva a esquecer quem somos. O silêncio nos revela”

Se não está nos seus planos viajar para a Finlândia em busca de quietude,  tampouco dar uma escapadinha pra algum lugar tranquilo, não se preocupe. Você pode trazer o silêncio para sua vida, por exemplo, fazendo pequenas pausas. Praticando meditação ou yoga. Ou qualquer coisa que te permita entrar em contato com o silêncio interior, com a “ilha de nós mesmos”, um conceito budista sobre encontrar um lugar dentro de nós onde possamos sentir a paz, independente do que aconteça ao nosso redor.

O caminho para você fazer do silêncio um sábio amigo passa por se desconectar. Não adianta a boca ficar em silêncio se os dedos e a mente estiverem ocupados com as atualizações das redes sociais e as mensagens do Whatsapp. “O ruído nos leva a esquecer quem somos. O silêncio nos revela”, disse o escritor espanhol Juan Arias.  Eu concordo. Na simples atitude de parar e silenciar, podemos ampliar a nossa visão da vida. Lembre-se: o silêncio pode ser a resposta para as nossas perguntas.

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