Muita gente nem para pra pensar: usa uma roupa um único dia e bota direto no cesto pra que seja lavada. Tem gente que nem olha pra ver se está suja ou cheira pra sentir se, de fato, a peça precisa de um banho. É puro hábito: usou, lavou. 

Só que isso tem alguns custos: financeiro, pelo gasto de água e luz; ambiental, pelo excesso de microplásticos e produtos químicos que jorram pelos canos; de tempo, porque lavar a roupa dá trabalho; e um custo da própria roupa, porque lavar demais as peças faz com que durem muito (muito!) menos.

Comecemos pelo hábito. Muita gente diz que lavamos muito as roupas no Brasil porque moramos num país tropical, onde geralmente suamos bastante e lavá-las seria uma necessidade. Mas não acho que seja só isso. Ousaria dizer que essa prática também é reforçada pela desvalorização do trabalho doméstico. 

Vivemos num país onde as mulheres da casa ou empregadas domésticas lavam a roupa (dentre outras atividades) por baixíssima remuneração ou remuneração nenhuma. E, quando não é a gente que lava a própria roupa (nem estende no varal, nem recolhe, nem passa e nem guarda), fica bem mais simples jogar no cesto e mandar pra lavar, não é mesmo?

Não é à toa que em países europeus, onde empregadas domésticas são um luxo, a discussão sobre lavagem de roupa está alguns passos na frente, como bem mostrou uma reportagem da BBC com pessoas que são adeptas da não lavagem. Em 2019, a estilista britânica Stella McCartney também declarou ao jornal The Guardian que lava suas roupas o mínimo possível: “Minha regra geral é: se realmente não precisa ser limpo, não limpe. Eu não troco meu sutiã todos os dias e não coloco roupas na máquina de lavar simplesmente porque as usei. Sou incrivelmente higiênica, mas não sou fã de lavagem”, afirmou na época.

“É comum o hábito de tirar a roupa e por pra lavar. É preciso refletir antes de agir no automático”

Uma pesquisa feita pela Water Research Foundation mostrou que a máquina de lavar roupas é responsável por cerca de 20% do consumo total de água de uma residência nos Estados Unidos. E, na pesquisa, a ONG faz um alerta: além do consumo de água, lavar as roupas mais vezes do que o necessário acaba deteriorando as peças mais rapidamente, aumentando assim a necessidade de comprar novas peças. 

Ou seja, não é só o gasto de água, lavar demais as roupas faz com que você seja obrigada a descartar as peças que ficam velhas rapidamente e claro, comprar mais roupas ao longo da vida. 

Faça de tudo para não lavar

Aqui no Brasil, algumas marcas preocupadas com o excesso de descarte de roupas e antenadas com a vanguarda neste assunto já estão orientando seus clientes a lavarem as peças o mínimo possível. A marca de jeans Yes I am manda  uma orientação na parte de dentro do bolso das calças que pode assustar os desavisados: deixar a calça no freezer por 24 horas. 

Raquel Ferraz, uma das sócias da marca, explica: “Existem opções desodorizadores no mercado, sprays que você usa para camuflar o cheiro da roupa. Porém, nós testamos uma outra opção sem custo que funciona: deixar seu jeans no freezer por 24h. A ideia é eliminar odor, seja de cigarro, daquele barzinho que você foi na noite passada, de comida ou do uso”, afirma. 

Assim, você só precisaria lavar seus jeans quando sujar de verdade. Ela ressalta que é importante colocar a peça dentro de um saquinho pra não grudar na vasilha do feijão congelado. E pra quem torceu o nariz, fica a informação de que Chip Bergh, CEO da Levi’s, já contou em entrevista que suas peças jeans ficam até 7 meses sem lavar.

Fazer nossas peças durarem é um ato amor pelo meio ambiente, pelo nosso dinheiro e também pelas nossas escolhas

Kelly Kim, sócia e estilista da marca Calma SP, que tem roupas com cores vibrantes, também manda a recomendação de lavar pouco (sempre com água fria, sem deixar de molho e secando na sobra) para seus clientes. “As pessoas têm o hábito de usar, tirar e jogar no cesto de roupa suja. O que recomendo é refletir antes de agir no automático”, afirma. 

Em casa, ela conta que usa algumas araras para deixar a roupa ventilando de um dia para o outro. “Geralmente depois disso, dá pra voltar pro armário, mas claro que se caiu comida ou sentei na sarjeta, coloco pra lavar”, conta. 

Kelly ainda faz um adendo: “Considero assassinato de roupa só separar as brancas das coloridas e tacar na máquina. Falo por experiência própria, eu mesma já assassinei muita roupa desse jeito”, diz. Segundo ela, um hábito que precisamos ter é cheirar as peças antes de decidir o que fazer com elas e ter um espaço onde deixar as peças ventilando. 

Fazer nossas peças durarem é um ato amor pelo meio ambiente, pelo nosso dinheiro e também pelas nossas escolhas. Eu, quando compro uma roupa, quero que ela dure pra sempre e sei que os maiores inimigos deste projeto são emprestar pros meus filhos e lavar demais. 

E pra quem chegou até aqui sem se convencer, deixo a fala de Mark Sumner, professor de moda sustentável da Universidade de Leeds, no Reino Unido, que tirei da reportagem da BBC: “Uma das piores coisas que você pode fazer com uma roupa, em termos de durabilidade, é lavá-la. Durante a lavagem, as roupas podem rasgar, encolher e perder as cores”.