Antes e depois e glow up - Mina
 
Seu Corpo / Reportagem

O problema do glow up

A cultura do makeover nos faz viver em busca da nossa versão mais magra – que, spoiler: não é a versão mais feliz. Que tal substituir "emagrecer" por "ser gentil consigo mesma"?

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Não é de hoje que somos engolidas por histórias de sucesso envolvendo a “cultura do makeover”. As crianças da década de 90, por exemplo, cresceram embaladas pela ideia de que ao emagrecerem, tirarem o aparelho dos dentes, transformarem o visual e parecerem o mais padrão possível, seriam felizes.

É a velha sensação de que, ao mudarmos o aspecto físico, solucionaríamos também os conflitos internos. Mas… até quando vamos acreditar nesse papo?

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Pra piorar, nas redes sociais é comum esbarrarmos em fotos de “Antes e Depois” que comparam apenas a aparência das pessoas (o quão magra ela está, na maioria das vezes), deixando de lado a saúde física. No Tik Tok, vídeos de “Glow Up” bombam, viram hits e alcançam bilhões de visualizações – quase 116 bilhões, para ser mais específica.

Assim como nos filmes de Hollywood, o problema é que o enredo desses vídeos é quase sempre o mesmo; um alguém (ou um alguém emagrecendo ou um alguém se transformando com quilos de maquiagem) que só consegue alcançar a felicidade depois que passa por uma mudança drástica em seu visual. Geralmente este alguém é uma mulher. É uma nova embalagem para uma fórmula bem antiga de sucesso.

Um Makeover na Cultura do Makeover 

“A beleza padrão e a mudança estética sempre nos foram vendidas como ponto de virada para a felicidade feminina”, reflete Clara Fagundes, pesquisadora e estrategista de comunicação para mulheres. É esse o fundamento da cultura do makeover, que há tempos inferniza nossa imaginação.

A cultura da opressão se atualiza e histórias de superação ganham roupagem diferente

Hoje em dia este discurso de sucesso-através-da-beleza ganhou novas características; graças à internet e aos movimentos de empoderamento feminino, a própria cultura do makeover teve que passar por um makeover, que, como sinaliza Clara, abraçou os discursos de amor próprio e autoestima feminina. “A opressão sempre se atualiza. E a forma de contar essas histórias de superação mudou, mas o conceito de que a felicidade e a beleza estão unidas continua firme e forte por aí”, constata a estrategista.

Se, antigamente, era comum esbarrarmos com programas de transformação visual nos canais de TV, hoje esta mesma narrativa nos é vendida de maneira mais sútil, só que, ainda assim, superficial.

Essa busca incessante por um corpo padrão serve apenas ao patriarcado

“É fácil encontrar influenciador que vende a ideia da magreza com o discurso de ‘melhor versão de si’. O que seria essa melhor versão? Enquanto continuarmos presas a esta busca incessante por um corpo padrão, estaremos servindo ao patriarcado. Deveríamos estar conversando sobre o valor da mulher para além da estética, e não associar seu sucesso à aparência”, finaliza.

Metas gentis para 2024 

Não colocar “emagrecer” na lista de objetivos para 2024 é apenas o começo de uma revolução. A psicóloga e ativista anti-gordofóbica Gabriele Menezes sugere que, para o próximo ano, a principal meta seja o autoconhecimento: “Mesmo o discurso do amor próprio às vezes acaba virando uma pressão. Eu substituiria ele por autorrespeito e autoconhecimento“.

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Entender quem se é para além da aparência, identificar os próprios gostos e reconhecer a sua história é um passo importante para se livrar dos rótulos e desejos alheios. “Quando reconhecemos quem somos de verdade, nos libertamos do que falaram que a gente deveria ser, inclusive no aspecto físico”, pontua Gabi.

E, veja bem, aqui não estamos dizendo que você está proibida de mudar de peso, de cortar o cabelo ou de fazer qualquer outra aventura estética, mas apenas para dissociar estas mudanças ao status de felicidade.

Você indicaria sua meta para uma amiga? 

Pense em metas gentis, que não se transformarão em um peso para a sua versão do futuro e que, pelo contrário, servirão de incentivo para encarar os dias seguintes. Reflita se seus objetivos são de fato um desejo seu ou se eles repercutem a vontade do(s) outro(s). E, por último, pergunte-se: você indicaria esta meta para uma amiga? Se não, recalcule a rota e comece novamente. A vida não é uma corrida, e você não precisa ter pressa na rota do autoconhecimento.

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