É só vontade de comer ou será compulsão alimentar? - Mina
 
Seu Corpo / Reportagem

É só vontade de comer ou será compulsão alimentar?

A compulsão alimentar é uma doença mental que afeta o nosso corpo e o jeito que lidamos com a alimentação. Ela muda a percepção sobre a fome e a vontade de comer

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Quando a gente olha pela janela e o dia está meio cinza e triste, um docinho geralmente ajuda a aquecer o coração. Mas, em dias felizes, a comida também tem esse papel de celebrar nosso humor, já percebeu? Numa festa na firma, é quase um acordo coletivo de que todo mundo vai se empanturrar pra ficar feliz junto. Entre celebrações, fome, necessidade e vontade, fica a pergunta: qual é o limite? Quando comer vira um problema? Hugo Cezar Palhares Ferreira, terapeuta Comportamental e neuropsicólogo, explica: “a diferença é que a fome acaba, a compulsão continua.”

Segundo o terapeuta, é preciso diferenciar os episódios compulsivos do transtorno compulsivo. Os episódios compulsivos são situações pontuais em que nos permitimos comer além do que estamos acostumadas, mesmo quando já estamos satisfeitas. Em um rodízio, por exemplo, é esperado que a gente coma mais do que o necessário. Isso tem a ver com uma questão cultural. São momentos específicos que ligam a comida ao prazer de reunir pessoas queridas, de comemorar. Então, nesse caso, você pode ir a um rodízio num dia, e depois seguir sua vida normalmente, sem que isso afete drasticamente sua relação com a comida. 

“O transtorno é a compulsão em vários momentos, não apenas em um episódio. Nesse caso, a pessoa não consegue ter forças para parar de comer”, afirma Hugo. Esse transtorno também pode ser medido pela periodicidade. Pode ser considerado compulsão quando “são vários episódios ocorrendo no mínimo três vezes por semana em um período mínimo de três meses”. 

Até a depressão pode ser uma possível causa para a compulsão alimentar

A compulsão está ligada ao jeito que lidamos com a comida. É uma desregulação do nosso sistema de recompensa. A causa do transtorno é multifatorial. Pode vir da forma como aprendemos a lidar com a comida na infância, de um hábito que usa a comida para aliviar a ansiedade, pode vir até do jeito que lidamos com nossos extintos ou também dos pensamentos indesejados vindos de um Transtorno Obsessivo Compulsivo. Até a depressão, comumente ligada à perda de apetite, pode ser uma possível causa para a compulsão alimentar.

Dietas inadequadas também podem levar à compulsão alimentar, porque o corpo tende a compensar a restrição de prazer e de nutrientes através da comida com um efeito rebote, e acabamos comendo muito mais. De qualquer maneira, a compulsão alimentar é uma desregulação do nosso sistema de recompensa, que tenta encontrar meios de aliviar o estresse e as tensões emocionais com a alimentação. No fim das contas, esse transtorno acaba envolvendo o sofrimento e aumentando justamente nossos hormônios de estresse, prejudicando o nosso corpo e aumentando as chances de desenvolver outras doenças.


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Com o descontrole na alimentação, quem sofre com a compulsão alimentar pode acabar ingerindo mais gordura, açúcares e sódio, que estão em alimentos que dão mais prazer. Isso pode levar a doenças como diabetes, hipertensão e obesidade. A pressão psicológica também afeta: quem sofre desse transtorno geralmente se culpa muito, ou tem pensamentos punitivos. Esse desgaste emocional eleva o nível de hormônios do estresse no sangue por tempo prolongado. Isso pode gerar problemas no coração e até o surgimento de câncer.

Como saber se eu tenho essa compulsão alimentar? 

Comer até ficar descontrolavelmente cheia, e depois se sentir com culpa e envergonhada com frequência é um primeiro sinal. Outros também são: preferir comer sozinha para evitar a vergonha, comer em horários diferentes das outras pessoas para poder comer mais, ou até não aceitar convites para poder comer o quanto quiser sem se sentir julgada. Tudo isso está muito conectado à culpa e a um sofrimento muito grande.

E tem remédio pra isso? 

Na prateleira da farmácia você não vai encontrar um remédio específico para este transtorno. Como a causa é multifatorial e muito ligada ao sistema de recompensa, os remédios que são usados no tratamento geralmente servem para regular esse sistema de recompensa novamente. Mas só isso pode não ser suficiente, Hugo alerta: o ideal é ter acompanhamento psiquiátrico, nutricional e psicológico, para entender como funcionam seus próprios mecanismos de controle da compulsão, além de uma melhor educação sobre a alimentação e como ela afeta o corpo. 


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E dá pra se prevenir?

Dá sim! De acordo com o terapeuta, a maior prevenção é a educação alimentar. É preciso compreender que alimentação é um processo complexo, que é influenciada por fatores sociais, psicológicos, além de fisiológicos. “A alimentação é um aprendizado. Quanto maior e mais abrangente for esse aprendizado, menor a possibilidade de eu usar a comida como um subterfúgio ou encarar ela como uma fuga”, complementa Hugo.

Toda pessoa obesa tem compulsão alimentar?

Muita gente acha que a compulsão é causada pela obesidade ou vive-versa. Mas isso não passa de gordofobia. Segundo Hugo, muitas pessoas que têm obesidade não sofrem de compulsão, assim como o contrário. Inclusive, a compulsão pode ter relação com a bulimia, um transtorno alimentar que está relacionado com a distorção da imagem pessoal e comportamentos de compensação, como provocação de vômitos, por exemplo. 

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