congelamento de óvulos - Mina
 
Seu Trabalho / Reportagem

Congelamento de óvulos pago pelas empresas é benefício para quem?

Existe uma série de benefícios pró-maternidade que vêm sendo ignorados há décadas por grande parte das empresas – o que faz parecer que o apoio financeiro ao congelamento de óvulos é apenas uma forma de adiar uma situação que elas consideram um problema.

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As mulheres estão tendo filhos mais tarde. Para muitas delas, essa é uma opção deliberada, proporcionada pela luta feminista que mostrou que existem outros caminhos de vido para além da maternidade compulsória. Mas, para outras – e também para algumas daquele primeiro grupo – é uma necessidade, porque maternidade e carreira, infelizmente,  ainda nos parecem palavras que não cabem na mesma frase. 

As empresas estão se tornando mais inclusivas ou apenas adiando o que consideram um problema? 

Nos dois casos, o congelamentos de óvulo surge como uma forma de prolongar o período fertil das mulheres, que tendem a ter uma reserva ovariana cada vez menor depois dos 35 anos. Mas, quando a motivação é o trabalho, a questão fica um pouco mais complexa, já que nossos colegas homens não sofrem os mesmos impedimentos que nós quando se tornam pais. P

Para se ter ideia, a taxa de ocupação (profissional) das mulheres de 25 a 49 anos que vivem com crianças de até três anos era, em 2021, de 54,6% contra 89,2% dos homens da mesma faixa etária e nas mesmas circunstâncias, segundo estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E o abismo fica ainda maior quando aplicamos recortes raciais.

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Nesse sentido, recentemente, no Brasil, apareceram notícias dando conta que algumas grandes empresas como Meta (Facebook), Mercado Livre e Fleury começaram a oferecer congelamento de óvulos como benefício trabalhista, arcando com até 75% dos custos, o que deixou muitas mulheres animadas.

Só que, analisando de forma ampla a maneira como a maternidade é tratada no mundo do trabalho, fico bem reflexiva: isso significa realmente que as empresas estão se tornando mais inclusivas ou será que estão adiando mais ainda o que consideram um problema? 

Digo isso porque existem diversos outros benefícios muito solicitados por mulheres que querem ser ou já são mães e que nunca foram implementados por boa parte das organizações. Equiparação salarial, creches perto da empresa e aumento da licença-paternidade são alguns exemplos de benefícios pró-maternidade que deveriam ser priorizados nessa discussão. Não só porque já são reivindicados há anos, como porque também serão uma necessidade para as pessoas que eventualmente congelarem óvulos.

Congelar os óvulos só será um benefício se fizer parte de um plano mais amplo 

Afinal, de que adianta esperar para ter filhos se, quando esse momento chegar, ainda não teremos um espaço seguro para gerir e criar essas crianças? Além disso, temos que refletir o quão boa é essa intenção, porque ela tem lá seus poréns: o procedimento de congelamento em si, que é caríssimo, está coberto. Mas e os medicamentos necessários para realizá-lo? E o desgaste que a mulher vive nesse período? E a taxa de manutenção dos óvulos? E a fertilização? 

Não quero ser pessimista sobre o tema, porque sou uma árdua defensora dos benefícios trabalhistas e da responsabilidade das empresas sobre a vida das pessoas, mas acho importante refletirmos sobre o contexto, as implicações e possíveis desdobramentos da ampliação dessa prática. Na minha perspectiva, congelar os óvulos só pode ser considerado um benefício de verdade se fizer parte de um plano mais amplo de apoio e inclusão a mães.

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É só pensar na licença-maternidade, por exemplo: o propósito é garantir que as mães não percam a renda, mas essa segurança tem um prazo curto. Além disso, assim que ele vence, a demissão vem em seguida em muitas empresas. Então o problema continua lá e, enquanto a gente se apoiar em benefícios paliativos, ele não será solucionado. Porque, no final, não é sobre dar poder de escolha pras mulheres. Fica mais parecendo um incentivo para um adiamento ainda maior daquilo que já nos sentimentos inseguras para decidir.

O congelamento enquanto benefício até pode até ser uma ideia boa, mas se não for acompanhado do avanço nas discussões sobre maternidade e carreira, acaba se tornando mais uma distração para realização dos nossos sonhos.

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