Ainda que o acesso ao atendimento em saúde mental especializado e de qualidade seja um direito de todos, fazer terapia é, geralmente, um privilégio. Quem nunca ouviu que é preciso ter um certo poder aquisitivo para usufruir deste espaço de escuta tão importante? Mas terapia não é só coisa de rico e tampouco coisa de louco.
Segundo um levantamento realizado pela Sul América, em parceria com o Instituto FSB Pesquisa, a saúde mental é a principal preocupação da população. No entanto, apenas 10% fazem piscoterapia. É um serviço que não chega à base, sendo a falta de recursos financeiros um dos grandes X da questão – se não, o principal.
“O acesso ao cuidado da saúde mental é tão importante quanto a alimentação, educação e emprego”
Mesmo que, para muitos, seja algo distante e até irreal, há alternativas. Sim, elas existem: com um olhar crítico e humanizado, muitas instituições têm o objetivo de democratizar a terapia.
“O acesso ao cuidado da saúde mental é tão importante quanto a alimentação, educação e emprego. Não deve ser tratado como assistencialismo, mas como algo fundamental para quem vive com até um salário mínimo e adoece mentalmente com jornadas excessivas de trabalho ou pela falta dele”, avalia Natália Silva, psicóloga e fundadora do Grupo Reinserir Psicologia, clínica localizada em São Paulo (SP), com foco em pessoas negras, mulheres e a comunidade LGBTQIA +. Além de oferecer atendimento psicológico a valores acessíveis, também se ocupa da (re)inserção destas pessoas no mercado de trabalho.
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É preciso democratizar!
Jayme Perenai e Grace Wanderley, psicólogos, ambos diretores do Libertas Comunidade em Recife (PE), reforçam que o suporte emocional é um direito de todos. “O nosso olhar, de sair das quatro paredes [do consultório], vem do desejo e movimento de ir em direção até as pessoas que estão nas periferias, nas escolas públicas, nas ruas ou quaisquer outro espaço. É possibilitar que essas pessoas possam se expressar e que se sintam aliviadas”, comentam.
Segundo o psicólogo, professor e coordenador do Núcleo de Psicologia Aplicada (NPA), da Universidade Federal do Espírito Santos, Adriano Pereira Jardim, o acesso democratizado às ações de psicologia na sociedade também “contribui para a transformação das relações sociais baseadas, por exemplo, no poder econômico e racial.”
“Sair das quatro paredes do consultório é possibilitar que qualquer pessoa possa expressar suas dores, mágoas e alegrias”
Tem, mas acabou (praticamente)
Apesar de o SUS oferecer acesso gratuito para pessoas de baixa renda, o número de pessoas que buscam pelos serviços psicológicos superam a quantidade de profissionais disponíveis na rede, o que gera uma longa fila de espera. “Clínicas sociais e profissionais autônomos que reservam alguns horários para atendimentos a baixo custo e/ou gratuito ajudam na diminuição dessa espera”, afirma Laila Rezende, psicóloga fundadora do Espaço Abayomi de Psicologia, clínica especializada no atendimento a pessoas negras em Belo Horizonte (MG).
A ideia de ampliar o acesso à terapia, é uma maneira de trazer à tona que o psicólogo tem um trabalho extremamente importante para diferentes esferas da sociedade. É o que acredita Fernanda Mishima, Doutora em Psicologia pela USP e Coordenadora do Projeto Fênix – USP para atendimento gratuito e online de crianças, adolescentes, adultos e famílias que foram afetados pela pandemia da COVID-19.
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Mudança na base e o papel do governo
Que tipo de ação precisamos, então, para que o atendimento terapêutico chegue em massa a todas as pessoas e partes do Brasil? Dr Jorge Monteiro de Lima, fundador do Instituto Olhos da Alma Sã, em Goiânia (GO), ONG que atua como clínica escola e social a preço acessíveis, afirma que há pouquíssimos profissionais com especialização na área de saúde mental. “O governo tem que investir em formação de profissionais e nas Universidades, só assim podemos pensar, de fato, em políticas públicas como a mudança deste cenário. No momento, faltam profissionais e a sociedade está adoecida”, conclui.
Já Natália ressalta que ainda temos uma psicologia muito distante da realidade brasileira e, que, portanto, a sua prática não compreende os impactos que a pobreza tem na saúde mental. “A formação também contribui quando instiga o aluno a se direcionar de uma forma incisiva na prática clínica, no consultório particular, restringindo sua atuação a quem tem maior poder aquisitivo”, diz.
Não dá para seguir dando as costas ou ignorando uma psicologia (e uma cultura) brasileira, negra, indígena, periférica e popular.
Para Adriano, é importante compreender e estudar o que se fez e faz em psicologia na Europa, mas que não dá para seguir dando as costas ou ignorando uma psicologia (e uma cultura) brasileira, negra, indígena, periférica e popular. “Também se faz psicologia com Conceição Evaristo, Bispo do Rosário, Beatriz Nascimento, Neusa Santos Souza, Abdias do Nascimento, Clementina de Jesus e tantas outras autoras que hoje estão mais ausentes que presentes na formação brasileira”.
A relevância das clínicas atuarem com a ramificação do atendimento social é reconhecida por Laila, mas ela também ressalta que não pode ser a única via. “É preciso que haja mais políticas públicas de saúde mental e uma real democratização desses serviços através dessa tríade: universidades, profissionais e Estado.”
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Derrubando preconceitos e distâncias
Além dos preços que assustam, criou-se durante os anos um senso comum de que a psicologia é coisa de louco, ou que a busca de ajuda é sinônimo de fraqueza. “O estigma aos cuidados à saúde mental diminui à medida que esses serviços se mostram mais acessíveis”, comenta Laila. “Para amenizar este preconceito e ideias previamente estabelecidas, nada mais saudável do que oferecermos terapia para o maior número de pessoas, seja em uma instituição como é a clínica escola de uma universidade, seja na Unidade de Saúde”, diz Fernanda Mishima.
A gente torce para que a saúde mental seja mais reconhecida e acessível para todos como de fato deve ser. Que fique claro que há muitas instituições e profissionais dispostos e a postos para isso. Veja abaixo:
Endereço: Rua da Bahia, 1148 – Centro, Belo Horizonte (MG)
Instagram: @abayomipsicologia | Site: www.abayomipsicologia.com.br
Endereço: Rua Barão de Itapetininga, 273, 10° andar, sala 1, República, São Paulo (SP)
Instagram: @gruporeinserir | Site: gruporeinserir.com.br/
Endereço: Rua Alameda Paraná, 1203, Qd 128 Lt.18/ Setor Jaó, Goiânia (GO)
Instagram: @olhosdaalmasa| Site: almabr.com.br
Endereço: Rua Rodrigues Sete, 158, Recife (PE)
Instragram: @comunidadelibertas | site: www.libertas.com.br
Endereço: Avenida Fernando Ferrari, 514, Goiabeira, Vitória (ES)
site: psicologia.ufes.br
Endereço: Av Bandeirantes, 3900, Monte Alegre, Ribeirão Preto (SP)
Instagram: @projetofenixusp