Fiquei nua para um banho coletivo e foi relaxamento puro - Mina
 
Nosso Mundo / Reportagem

Fiquei nua para um banho coletivo e foi relaxamento puro

Nossa editora Clara Novais testou uma casa de banho no meio de São Paulo. Teve sauna, escalda-pés, chuveira e papo com desconhecidos (também nus) no sol. O mais chocante? Passar duas horas apenas relaxando, sem assistir ou escutar nada.

Por:
10 minutos |

A temperatura de São Paulo lá em cima, uma lista enorme de tarefas para cumprir antes do ano acabar e recebo uma missão inesperada no trabalho: experimentar uma casa de banho localizada há 2 quadras de distância do QG da Mina. Sauna no calor? No meio da semana? No furacão que é o fim de dezembro? Achei uma loucura, mas agendei o serviço e, às duas horas de uma quinta-feira de sol e trabalho, lá estava eu, munida de duas toalhas e um roupão, como orienta o FAQ do Banho Urbano, localizado na Vila Madalena.

Quem me recebeu foi o proprietário, Milton. Um homem de meia idade, de fala tranquila e roupas despojadas. Me explicou sobre o funcionamento do espaço, repetiu as regras (eu já havia assinado um termo de compromisso com algumas delas) e me deixou à vontade no vestiário para tirar minha roupa e guardá-la, junto com meu celular e outros pertences. Afinal, banho de roupa só no BBB. Ali é uma casa de banho inspirada nas européias e asiáticas – onde a nudez é comum – e não um reality show em que está todo mundo te vigiando.

O ambiente é seguro e fiscalizado. Condutas sexuais e consumo de álcool e outras drogas é proibido

O roupão é só para sair do vestiário e caminhar até a área do banho, que é compartilhada com outras pessoas. Quando cheguei, uma moça tomava sol. “Tô aproveitando pra tirar a marquinha do biquini”, disse, sorridente. Tirei meu roupão sem constrangimentos. Ficar pelada na frente de estranhos, ou de qualquer pessoa, nunca foi uma questão para mim. O que me restringe é, na verdade, o medo de violência por parte dos homens. Mas como ali era um ambiente seguro, fiscalizado, em que condutas sexuais e o consumo de álcool e outras drogas é proibido, a nudez não me afligiu em nada. Nem lembrei que estava pelada ao longo da tarde. 

Comecei seguindo a primeira orientação do Milton – tomar uma chuveirada caprichada, por questões de higiene –, depois bati um papo rápido com a moça do banho de sol. Ela contou que, assim como eu, era de BH, morava em SP há 6 anos e passou a frequentar o Banho Urbano há alguns meses a convite de uma amiga e não parou mais. Hoje, paga o pacote mensal, que inclui quatro sessões, e estava planejando comemorar o aniversário por lá nas próximas semanas. 

O espaço só aceita pessoas indicadas por quem já frequenta. Justamente para garantir a segurança e o conforto dos clientes, afinal, aqui no Brasil, a maioria das saunas públicas são espaços para pegação. Não existe uma cultura de banho coletivo apenas para relaxamento. Aliás, de uma forma geral, nossa relação com a nudez é muito diferente da europeia, onde estabelecimentos assim são comuns. Lá os corpos são menos sexualizados em momentos de lazer. Quem já tomou banho de rio ou foi para a praia deve ter notado que topless é comum e que não existe vigília sobre os corpos. 

Como aqui o cenário é outro, os proprietários tomam bastante cuidado com quem recebem. Só aos domingos que o cenário é diferente: é liberado o uso de biquini/maiô/sunga) e todo público é bem-vindo. A moça do sol planejava comemorar seu aniversário num domingo.

Relaxar mesmo, que exótico

Pausei o papo para ir experimentar a sauna úmida. Entrei, molhei a parte do mármore onde iria sentar e tirei o excesso da água com um rodinho, como o Milton orientou. Aí percebi que, apesar de me considerar uma pessoa que prioriza os momentos de descanso, não me lembrava qual foi a última vez que ousei descansar sem estar assistindo, ouvindo ou lendo algo. Tem sempre um podcast na minha orelha ou um TikTok na minha cara. Ali, tinha só eu, o vapor e a nostalgia. Sauna úmida me lembra muito a minha infância. Imediatamente me transportei para os feriados no sítio dos meus tios. Sorri de corpo todo.

Fiquei ali alguns minutinhos, deitada no mármore, feliz em não fazer nada, apenas concentrada em relaxar. Deu certo. Logo no início da experiência, já me sentia menos tensa. O que vai de encontro com estudos apontam que tratamentos térmicos, como as saunas, relaxam justamente por direcionar a nossa atenção para isso. Também há indícios de que o calor estimula o corpo a liberar endorfina, hormônio do bem-estar, e a baixar o nível de cortisol, hormônio do estresse. Fora outros benefícios para a saúde corporal.

Depois segui para o tanque de contraste, que pode ser melhor descrito como um ofurô grande e gelado. A ideia é realmente causar um choque de temperatura no corpo, o que estudos indicam ser ótimo para recuperação muscular após exercício físico e reduzir inflamações. A exposição ao frio também tem seus benefícios: estimula a liberação de adrenalina e noradrenalina, o que ajuda a aumentar o nível de energia e concentração, e há indícios de que ajuda a reduzir a ansiedade

Você nunca entrou numa piscina sem biquíni, maiô ou sunga? Pois recomendo fortemente

Foi muito gostoso ficar sentada ali naquele tanque frio em um dia de sol. Porém, o choque não foi muito grande. A água não estava tão gelada assim, como apontou uma professora de ioga que dividiu o tanque comigo. “No inverno, isso aqui fica muito mais gelado. É muito bom sair da sauna quentinha, saindo fumaça, e vir para cá”, garantiu. Na hora, meu único pensamento foi: “preciso voltar para conferir”. Vou por na agenda.

Quando ela saiu, aproveitei para boiar um pouco. Acho muito gostosa a sensação da água tocando o corpo todo sem nenhuma proteção por cima. Se você nunca entrou numa piscina sem biquíni, maiô ou sunga, recomendo fortemente que o faça. O frescor direto na pele das partes íntimas dá uma sensação de liberdade muito gostosa.  Em seguida, resolvi imitar a amiga do início e tomar um pouco de sol. Nenhum plano de ficar sem marquinha por aqui, mas de conquistar um belo bronzeado e recuperar minha vitamina D que anda baixa. 

O escalda-pés

Mais uma bela chuveirada e entrei na sauna finlandesa, a famosa sauna seca. O ar estava bem quente, 60ºC, e normalmente acho desagradável o tanto que é seco ali dentro, mas a moça de BH tinha feito propaganda do momento em que o Milton bafora óleo essencial e decidi experimentar. Quando entrei, ela tava batendo um papo animado com um professor de ioga, frequentador assíduo também. Coloquei minha toalha no banco de madeira e sentei.

Ele me disse que só passou ali para combinar com o proprietário sobre uma sessão especial de banho de imersão em gelo que estava organizando, mas foi ficando. A conversa com os dois estava tão animada que nem senti o ar da sauna tão seco assim. Fiquei concentrada na minha respiração para lidar com a alta temperatura e tudo o que senti foi uma sensação deliciosa de coração acelerado, como se tivesse realizando uma atividade física.

A ciência confirma que a frequência cardíaca aumenta e os vasos sanguíneos se dilatam quando estamos na sauna – e isso aumenta a circulação de forma semelhante a um exercício leve a moderado. Como consequência, estudos apontam que tomar sauna regularmente ajuda a reduzir a pressão arterial e pode beneficiar pessoas com fatores de risco para doenças cardíacas, como colesterol alto, pressão alta e diabetes. O importante é não ficar mais de 15 minutos direto no calorão e lembrar de se hidratar bastante – para isso, há dois bebedouros disponíveis no Banho Urbano.

Foi bem especial, e até um pouco chocante, passar duas horas apenas relaxando sem escutar ou assistir nada

No meio dessa história, o Milton apareceu para baforar o óleo essencial. O ambiente todo foi tomado por aquele aroma cítrico e uma sensação de alegria e conforto se instalou em mim. Os óleos essenciais têm essa magia de se conectar com a parte do cérebro que controla as emoções. Eles já fazem parte da minha rotina, principalmente o de lavanda, que me ajuda a dormir melhor, mas ali, na sauna, a 60ºC, sem roupa, conversando com gente interessante e interessada, no meio de tantas experiências focadas em bem-estar, foi ainda mais legal.

Depois, tomei mais uma chuveirada e decidi curtir escalda-pés. Ali perto dos chuveiros, tem um banquinho de madeira para sentar e dois lavatórios no chão para esse momento. O tratamento tem um custo à parte, menos de dez reais, e é preciso colocar o roupão para ir até a recepção pedir o potinho com sais de banho, mas é coisa rápida. No cardápio, também tem máscaras capilares e outros tratamentos, porém parei no escalda pé. Liguei a água quente do lavatório e joguei os sais de banho. Logo subiu um cheirinho cítrico delicioso. Sentada ali, interagia com outros clientes que passavam para entrar na sauna seca ou usavam o chuveiro. E o mais importante: seguia vitoriosa na missão relaxamento.

Santo remédio

Por fim, dei mais um mergulho no banho de contraste, lavei meu corpo e cabelo no chuveiro (o espaço disponibiliza sabonete, xampu e condicionador) e fui para a sauna a vapor deixar o condicionador fazer efeito e curtir meus últimos minutos de descanso lúdico. Missão cumprida. Quando estava no chuveiro tirando o resto do produto do cabelo e me refrescando pela última vez, minha amiga do sol passou apressada: tinha perdido a hora de buscar a filha numa aula. Enquanto o professor de ioga, que me disse que já tava indo embora 40 minutos antes, entrou na sauna seca. 

Ou seja: que perigo esse negócio de tirar um tempo para cuidar do próprio bem-estar, você pode acabar gostando e se prolongando (contém ironia). Ainda tinha direito a mais duas horas de banho por lá (são 4h no total), mas depois de experimentar tudo o que o espaço tinha a oferecer naquele dia e de sentir que estava tão relaxada, senti que era a hora de ir embora focar nas minhas outras tarefas, mesmo sem relógio. 

Acho que isso de ficar tão relaxado a ponto de perder a hora requer prática. Vou precisar voltar. Ainda assim, foi bem especial – um pouco chocante, eu diria – passar duas horas de uma tarde de quinta-feira dedicada apenas a relaxar. Geralmente, tem sempre algo ativo envolvido. Por exemplo, atividade física relaxa e torneia o corpo, ver TV relaxa e traz nova bagagem cultural. Já no banho coletivo tem um único foco: relaxar. Coisa que eu só faço quando estou tentando dormir, mesmo sendo editora da Mina e sabendo de cor os benefícios essenciais de descansar.  

De volta na redação (sim, tinha que voltar), de cabelo molhado e ombros mais leves, minhas colegas gostaram de ver a minha feição. Minha chefe disse que nunca tinha me visto com aquela cara. O triste foi ter que precisar recorrer ao cafézinho para ter algum pique para trabalhar. Sonho meu terminar o dia numa rede. Mas sei valorizar minhas conquistas: com certeza, aquelas duas horas deixaram o resto do dia atribulado mês mais leve. Relaxamento e nudez desencanada, um santo remédio.

Mais lidas

Veja também