Seis mitos sobre saúde mental que podem estar te prejudicando - Mina
 
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Seis mitos sobre saúde mental que podem estar te prejudicando

O psicólogo e professor da The School of Life, Saulo Velasco, compartilha lições valiosas da psicologia para que esse conhecimento se torne acessível pra quem deseja viver melhor

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Os sentimentos que vivenciamos ao longo da vida, desde a infância, nos influenciam a todo momento, mesmo quando não nos damos conta conscientemente deles. Eles modulam a forma como reagimos a determinadas situações e pessoas, o que queremos, o que tememos e o que escolhemos.

Um caminho para desembrulhar atitudes, pensamentos e sentimentos que nos influenciam é conhecendo as descobertas e teorias dos pensadores mais relevantes da psicologia – a ciência da vida mental e do comportamento. Isso também nos ajuda a crescer emocionalmente e a não seguir crenças sociais que na realidade são mitos e, muitas vezes, prejudicam a nossa saúde mental. Destaco algumas a seguir.

Emoções, como raiva e tristeza, são prejudiciais e devem ser evitadas: mito! 

Todas as emoções, positivas ou negativas, são essenciais para o nosso funcionamento. Elas são como termômetros internos, nos alertando sobre o que está acontecendo em nossas vidas. Emoções negativas nos informam sobre possíveis problemas que estejamos enfrentando, estimulando a busca por soluções. 

Emoções positivas, por outro lado, amplificam o que valorizamos e o que nos faz bem, motivando ações dirigidas à manutenção do bem-estar. Em vez de lutar para suprimir emoções negativas, devemos examiná-las com mais atenção e curiosidade. Entender melhor por que reagimos a uma determinada situação com uma certa emoção ajuda a compreender melhor porque aquela situação é realmente um problema para nós.

Segundo a psicanálise, não buscamos felicidade no amor, mas familiaridade

Encontrar a “cara metade” é o bilhete de ouro para a felicidade eterna: mito!

Embora seja sedutora, essa ideia pode nos levar a expectativas não realistas e a decepções profundas. A verdade é que a felicidade no amor requer trabalho contínuo, comunicação eficaz, compreensão mútua e disposição para resolver conflitos de maneira construtiva. Essa perspectiva é especialmente importante ao considerar que nem sempre escolhemos parceiros ou parceiras por sua aparente capacidade de nos fazer felizes. 

Segundo a psicanálise, não buscamos necessariamente felicidade no amor, mas familiaridade. Freud argumentou que somos atraídos por parceiros que nos lembram, em algum nível, os nossos primeiros objetos de amor: nossos pais. Isso não significa que buscamos pessoas idênticas aos nossos pais, mas que procuramos padrões emocionais, comportamentais ou, até mesmo, físicos que nos sejam familiares.

Procrastinação é sinônimo de preguiça e má gestão do tempo: mito!

Longe de ser apenas uma questão de preguiça, a procrastinação pode ser um sintoma de ansiedade, medo do fracasso ou, até mesmo, perfeccionismo. A chave para superar a procrastinação não é, portanto, se esforçar mais, mas entender os sentimentos subjacentes e lidar com as suas causas. 

Outro mito comum é que a procrastinação é, puramente, uma questão de má gestão do tempo. Embora o gerenciamento do tempo desempenhe um papel crucial em seu combate, a procrastinação é, frequentemente, um problema de gerenciamento emocional. Muitas pessoas procrastinam para evitar sentimentos desconfortáveis associados a uma tarefa e não porque são incapazes de organizar seu tempo efetivamente. 

Por outro lado, pesquisas mostram que a procrastinação também é influenciada por fatores genéticos e ambientais. Pessoas mais impulsivas têm mais dificuldade em resistir à gratificação imediata e, portanto, são mais propensas a adiar tarefas pouco prazerosas ou muito custosas. Do ponto de vista ambiental, um ambiente de trabalho estressante e a falta de apoio social também podem contribuir para a procrastinação.

O autocontrole é um recurso finito

Autocontrole é simplesmente uma questão de força de vontade: mito!

Esse é outro mito muito relacionado à procrastinação. Essa visão sugere que o autocontrole é um recurso inesgotável que pode ser acessado à vontade. No entanto, as pesquisas atuais em psicologia sugerem que o autocontrole é um recurso finito. Seu uso prolongado pode levar à fadiga, sendo necessário recarregá-lo por meio de práticas de autocuidado. 

Além disso, o autocontrole é uma habilidade que pode ser aprendida e aprimorada. Embora algumas pessoas possam ter maior predisposição a exercê-lo, todos podem desenvolver estratégias para fortalecer o autocontrole. Estabelecer metas realistas, gerenciar o tempo, modificar o ambiente para favorecer hábitos desejados e inibir os indesejados, desenvolver o autoconhecimento e a autorregulação emocional são bons exemplos de estratégias desse tipo.

Inteligência emocional e cognitiva são traços inatos e imutáveis: mito!

Há muito tempo, essa ideia errônea tem influenciado visões sobre educação e desenvolvimento pessoal. Esse mito, no entanto, é desafiado por várias pesquisas e teorias contemporâneas da psicologia e da neurociência que mostram que podemos cultivar e melhorar várias formas de inteligência ao longo da vida. Isso inclui a inteligência emocional, além da cognitiva. 

O mito da inteligência inata, frequentemente, ignora a importante interação entre genética e ambiente. Enquanto a genética pode definir uma base para o desenvolvimento intelectual, o ambiente, a educação, a prática e a experiência têm papéis fundamentais ao moldar e desenvolver a inteligência. 

Ele pode ter implicações prejudiciais, como limitar o potencial de aprendizado de indivíduos que acreditam que sua inteligência é fixa. Por outro lado, a constatação de que a inteligência pode ser aprimorada tende a promover uma cultura de aprendizado contínuo e adaptabilidade.

Fazer terapia  é sinal de fragilidade: mito!

Antes mesmo de me tornar psicólogo, eu sempre acreditei que ir à terapia não é um sinal de fragilidade, mas, sim, um compromisso maduro com a própria saúde mental. Sou, ainda, um defensor de que as boas ideias de Freud, Skinner, Winnicott, Rogers, Maslow, Piaget, Vygotsky, Bowlby e Bandura, entre muitos outros, devem ser acessíveis, de forma simples e envolvente, para que todos possam aplicá-as aos desafios do dia a dia, dentro e fora dos consultórios de terapia. 

Não apenas àqueles que desejam atuar como terapeutas, mas para todas as pessoas que tenham interesse e curiosidade pelo funcionamento da mente humana, para aqueles que desejam viver melhor com bem-estar mental e emocional.

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