Ansiedade climática - Mina
 
Nosso Mundo / Reportagem

Será que “ansiedade climática” existe mesmo?

Entenda por que o termo mais usado dos últimos dias vem sendo questionado – e isso não tem nada a ver com negacionismo

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Que calorzão é esse? Ou será que quando você está lendo essa reportagem já está frio? Antes mesmo da primavera dar as caras, as temperaturas subiram fazendo a gente beber mais água e sonhar com uma piscina gelada em casa. Mas antes fosse só isso, essa alteração nas temperaturas também fez muita gente perder o sono e ficar agoniada com o calor fora de época – o que muitos especialistas chamam de ansiedade climática ou ecoansiedade. Mas será que é isso mesmo? Nem todo mundo concorda – e não se trata de negacionismo, pelo contrário.

Vamos começar por entender o termo: ele não é novo,  já aparece nos livros de ecopsicologia desde 1990, mas ganha força à medida que o aquecimento global avança, impactando, entre muitas coisas, no nosso bem-estar mental.  A Associação Americana de Psicologia (APA), descreve a ansiedade climática como “o medo crônico de sofrer um cataclismo ambiental que ocorre ao observar o impacto das mudanças climáticas gerando uma preocupação associada ao futuro de si mesmo e das gerações futuras”.

Porém, quem pesquisa o assunto desde a época da criação do termo tem ressalvas, como o psicólogo Marcos Ferreira, diretor do Instituto Silvia Lane e pesquisador da psicologia ambiental. “Existe uma mania de psicopatologizar tudo”, comenta. Para o especialista, a gente pode tranquilamente trocar a expressão “ansiedade climática” por “medo” mesmo, já que a ameaça é clara. “A ansiedade é um quadro mais indefinido de inquietação”. 

“Temos que tomar cuidado ao patologizar situações”

O psicólogo garante: “É positivo que a gente chame a atenção para as vivências psicológicas geradas pela informação sobre os riscos que a vida humana corre”. O que ele questiona é a forma como colocamos isso: “Não podemos colocar um rótulo que diz ‘essa pessoa não consegue ficar tranquila porque tem um problema, uma ansiedade que é dela’, quando, na verdade, nenhum de nós deveríamos estar tranquilos porque a degradação ambiental é real”, diz. 

Crises de ansiedade são individuais, um problema do sujeito e as questões ambientais não são um problema individual. Ele ainda afirma que a aflição perante as adversidades que a humanidade vai enfrentar, como apontam inúmeros estudos, não é causada por um problema ambiental, mas social. “Nota-se que existe uma ameaça, mas como vemos que a sociedade não está dando conta de enfrentá-la, pelo contrário, está aumentando o problema a cada dia, ficamos com medo”, afirma.

Dar o nome correto é importante para conseguirmos responsabilizar as pessoas certas por um problema que está cada dia mais palpável. Não é você que está pirando com o calor fora de época – o que a expressão “ansiedade climática” insinua. São os governantes que não estão tomando as atitudes adequadas para barrar o aquecimento global. 

Mas sim: “Basta ligar a TV, que vemos desastres naturais, como queimadas, inundações, terremotos e isso desperta uma enorme preocupação, principalmente naqueles que têm consciência e se informam constantemente sobre assuntos que envolvem o futuro do meio ambiente”, comenta a psicóloga Iane Nobre, do Canto Baobá E, no âmbito individual, é possível criar estratégias para lidar com esse medo. Para ela, é importante pensarmos de forma coletiva. “Estar em contato com a sua rede de apoio e encontrar formas de cuidar do meio ambiente que estejam ao seu alcance pode ajudar a lidar com a inquietação individual”, orienta. Aqui outras dicas que podem ajudar:

  • Se conscientizar sobre o clima é importante, mas também não precisa acompanhar todas as notícias sobre o tema. Isso pode acabar te paralisando.
  • Sentir que está fazendo a sua parte pode ajudar. Adote práticas sustentáveis, como reduzir o uso de plástico, separar o lixo para reciclar, comer menos carne e diminuir o consumo de energia elétrica.
  • Como as ações mais importantes para o combate a essa questão estão no âmbito político é fundamental eleger gente que tenha essa pauta na agenda. Na hora de votar, escolha candidatos que tenham projetos claros na área. 
  • Já dizia o ditado que uma andorinha só não faz verão. Não se cobre tanto, como se salvar o planeta estivesse apenas nas suas mãos. Esse trabalho precisa ser coletivo. O que cada um de nós pode fazer de mais efetivo é se juntar aos demais e pressionar governantes e empresas.

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