Quem nunca teve a impressão de que um namorado, namorada, amigo ou parente não gostava da gente, mas na verdade, era apenas uma falha na comunicação dos sentimentos? A maneira como as pessoas expressam o amor não segue uma cartilha e isso pode azedar algumas relações, já que o que é demonstração pra uns pode não ser pra outros (e vice-versa). E vamos combinar: dizer “eu te amo”, com todas as letras, é difícil pra muita gente. É por isso que precisamos estar atentos, tem amor que vem até em forma de torta de azeitona!
Sim, já aconteceu comigo, foi a primeira vez que me senti querida pela minha sogra e percebi que ela gostava de mim! Depois da torta, e ao longo dos 15 anos do meu relacionamento, recebi muitas demonstrações de amor dela. A maioria em forma de carona quando estava atrasada, marmita pra levar pro trabalho ou a comida que mais gosto no jantar.
“A suprema felicidade na vida está na convicção de que somos amados”
No livro “As 5 linguagens do amor”, Gary Chapman, faz um bom resumo de cinco linguagens básicas pelas quais esse sentimento é expressado e compreendido. Vamos a elas? Palavras de afirmação: através de elogios, incentivos e declarações. Tempo de qualidade: dar atenção completa à pessoa (se ficar olhando no celular não vale!). Presentes: uma flor, chocolate ou algo feito por você (o que vale é a lembrança, não o valor). Atos de serviço: o nome é feio, mas significa realizar tarefas juntos e ajudar em coisas práticas (arrumar a casa, ajudar num trabalho, consertar o carro). E por último, o toque físico: andar de mãos dadas, fazer cafuné, abraçar e beijar. Vale ressaltar também que não possuímos somente uma, mas ao menos duas linguagens do amor nas nossas expressões de afeto, sendo a primária e a secundária.
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Onde tudo começa
“A suprema felicidade na vida está na convicção de que somos amados”, dizia o poeta francês Victor Hugo. Sentir-se amado é uma necessidade emocional primária no ser humano. O psicanalista Christian Dunker, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), cita um estudo realizado no pós-guerra que analisou o comportamento de bebês que viveram com e sem afeto e mostra como isso influencia o desenvolvimento.
Nele, observou-se que os bebês criados por um orfanato onde não recebiam carinho, ou eram embalados no colo, sofriam de insônia, falta de apetite, não ganhavam peso e não demonstravam expressão no rosto. Aos poucos, esses bebês perdiam interesse de se relacionar e muitos morriam antes de completar 1 ano. “A falta de amor mata mesmo! É literal, não apenas uma metáfora”, enfatiza Dunker.
Além disso, outras pesquisas revelam que nosso cérebro processa a dor de uma rejeição, decepção ou exclusão na mesma área em que processa uma dor física. Isso também ajuda a explicar o motivo de querermos ser queridos, aceitos. O contrário disso realmente dói em nós.
“Precisamos estar abertos para satisfazer as necessidades do outro”
Saulo Velasco, psicólogo e professor da The School of Life, explica que a maneira como os cuidadores de cada pessoa demonstraram afeto na infância terá grande impacto nas relações futuras. “Temos modelos parentais e tendemos a reproduzi-los ao longo da nossa história. Se eu cresci em uma família onde as pessoas davam e recebiam muitos presentes, é provável que eu entenda que o amor/afeto é demonstrado dessa maneira. Se eu tenho uma família mais carinhosa, que pega no colo, abraça muito, beija, tenho uma tendência a acreditar que amor se demonstra assim”, afirma. Ele ressalta que podemos ir mudando ao longo da vida, por meio de novas experiências, mas aquilo que a gente aprende – especialmente na primeira infância – tende a nos marcar em relação ao modo como o afeto é demonstrado.
Se relacionar bem exige entendimento
E como fazer dar certo uma relação entre pessoas que têm jeitos diferentes de demonstrar amor? Compreender as diferenças na maneira que cada um demonstra afeto pode ser parte da solução. “Quando um não entende a linguagem predominante do outro, uma das consequências desse desalinhamento é o conflito, a insatisfação”, diz o professor da The School of Life. Segundo o especialista, ter consciência de que as pessoas possuem maneiras diferentes de demonstrar afeto é fundamental para que a gente possa saber que um gesto do outro – que para mim não significa amor –, pode ser sim uma demonstração bem-intencionada, e que a pessoa está fazendo da melhor forma que pode.
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Para Marina Vasconcellos, terapeuta familiar e de casal pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), tanto para saber a melhor forma de dar (aquilo que o outro precisa, não o que você “acha” que ele precisa) quanto para saber receber e entender a verdadeira intenção de cada ato, é preciso comunicar um ao outro sua necessidade. Ela também sugere que devemos estar abertos para satisfazer as necessidades do outro, mesmo que isso não seja tão importante para nós. “Faz parte da relação fazer pelo outro em alguns momentos apenas para deixá-lo feliz”, diz. Afinal, quando uma ação não é natural, ela se torna uma expressão de amor ainda maior.
O mais importante é ter em mente que cada um é único e tem seu jeito de amar e demonstrar amor. E existem muitas formas de dizer “eu te amo”: “te trouxe um café”, “deixa que eu te ajudo com essa tarefa”, “você fica muito bem com esse vestido”, “eu te busco no aeroporto”, “leva um casaco que tá frio lá fora”, “ouvi essa música e lembrei de você”… A gente só precisa prestar atenção.