Quem precisa de botox preventivo? - Mina
 
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Quem precisa de botox preventivo?

Recorrer à aplicação de toxina botulínica antes dos 30 é uma tendência e também a triste constatação de que o pavor de envelhecer acomete mulheres cada vez mais jovens

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Temos falado muito sobre a necessidade de respeitar o amadurecimento e o envelhecimento. Mas dados e tendências mostram que ainda estamos longe de uma aceitação de fato.  Vídeos como “Tudo que você precisa saber sobre botox preventivo”, “Meu antes e depois do botox preventivo”, “Aplicando novamente meu botox preventivo”, não param de bombar entre jovens no Tik Tok. Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), o botox é o procedimento mais realizado entre pessoas que têm entre 18 e 30 anos, com um aumento de 300% nos últimos três anos. 

A ideia do procedimento é que, para evitar serem pegas pelo tempo, as mulheres recorram à “prevenção” ao invés da “correção”. Um discurso que é real e funciona muito bem se pensamos em cuidar da pele desde cedo. Mas será que fazer botox é o mesmo que passar protetor solar, usar hidratante e só ir à praia de chapéu?   

Funciona, mas…

Para a dermatologista Ana Carolina Sumam, o botox preventivo pode ser um aliado eficaz para evitar o aparecimento de rugas mais profundas, especialmente em áreas como a testa e ao redor dos olhos. Mas ela explica que ele deve ser uma ferramenta apenas para quem apresenta fortes linhas de expressão. “Iniciar o uso de botox com moderação pode ser interessante para pacientes que apresentam linhas de expressão desde cedo. Com isso, conseguimos evitar a fixação de rugas que podem dar um aspecto de cansaço e até mesmo de tristeza ao rosto”, explica. 

Ou seja, tecnicamente, o botox preventivo funciona, mas a pergunta é: será que precisa? 

Envelhecer, de fato, traz um aspecto de cansaço, traz, também, diminuição de colágeno, rugas e flacidez. Mas será que “combater” é a única resposta? Tudo isso não deveria ser visto como algo natural da passagem do tempo? Ganhamos experiência e maturidade e perdemos a pele lisinha. Mas não, o que tem acontecido é uma busca cada vez mais precoce por coisas que apaguem os sinais de que estamos ficando mais velhas. 

“Todo botox é preventivo, ele é feito para prevenir as linhas definitivas”

Betina Stefanello, dermatologista e coordenadora do setor de cosmiatria da Sociedade Brasileira de Dermatologia do Rio de Janeiro, se preocupa: “Fico indignada com esses posts feitos por jovens de 20 e 30 anos. O botox preventivo, na minha opinião, é um nome criado pra marketing, pois ele não vai ser preventivo para qualquer ruga dinâmica, mas sim de rugas estáticas”, explica a especialista.

Ruga dinâmica é aquela que aparece só quando você contrai o rosto, levanta a sobrancelha ou as linhas de contração da testa. Já a ruga estática é quando, mesmo com o rosto em repouso, a ruga continua lá. “Ou seja: todo botox é preventivo, ele é feito para prevenir que o paciente desenvolva aquela linha definitiva. Então, independentemente de ser antes dos 30 anos ou depois, o recomendado é que se faça quando o paciente tem realmente muitas rugas e isso incomoda”, diz.

Efeito colateral

O principal efeito colateral do botox preventivo não está nas agulhadas em si, mas sim no que acontece socialmente, principalmente com as postagem sobre o assunto nas redes. Um estudo realizado em agosto de 2023 na Universidade Charles Sturt, na Austrália, mostra o efeito de publicações focadas em estética. Eles acompanharam 273 mulheres, entre 18 e 28 anos, analisando duas experiências distintas: uma parte foi exposta a publicações de dietas extremas, corpos magros, “vida fitness” e beleza e outra assistiu a conteúdos com vídeos sobre animais, culinária e comédia.

Os resultados? As participantes expostas aos conteúdos de estética e beleza apresentaram uma maior insatisfação corporal, indicando que o consumo repetido desses materiais pode influenciar de forma negativa a autoestima e a saúde mental. 

A psicóloga Rachel Hogg, responsável pela pesquisa, apontou que o algoritmo das redes sociais têm um papel fundamental no reforço de estereótipos altamente prejudiciais. Esses conteúdos favorecem uma visão distorcida de beleza e incentivam práticas que podem prejudicar a relação com o próprio corpo e a com a (inevitável) ideia de envelhecer.

O episódio De Repente Velhos do podcast Vibes em Análise, discutiu o tema em cima da crítica feita no filme A substância. Ali, os apresentadores questionaram: afinal, qual o problema de envelhecer? 

Muita gente nas postagens (e fora delas) se justifica, “não me sinto bem com rugas”, “não gosto do aspecto que as rugas me dão”, “minhas marcas de expressão são muito fortes”. E tudo isso é compreensível justamente porque vivemos numa sociedade onde envelhecer é um defeito e deve ser evitado. Mas quando o fato de ter marcas de expressão aos vinte e poucos anos vira um problema, é preciso se afastar do que vemos no espelho para analisar a cultura criada em torno da necessidade de evitar os sinais do tempo.

Ninguém tá dizendo que não é pra se cuidar

Ada Trindade, dermatologista e membro da Academia Brasileira de Dermatologia, reforça que o botox preventivo, e também de outros procedimentos, devem ser realizados com cautela, principalmente em pessoas muito jovens. “É um tratamento seguro quando bem indicado, mas o uso excessivo ou a aplicação inadequada pode acabar modificando as expressões naturais do rosto”, alerta. A especialista sugere que os pacientes considerem outros tratamentos alternativos, como peelings e hidratações, que podem contribuir para a manutenção de uma pele saudável e jovem.

Hoje, existe um conceito interessante que se encaixa muito bem aqui. Ao invés de pensar em anti-aging muitos especialistas falam em well-aging, uma abordagem mais natural do envelhecimento. Nela, ninguém luta contra o tempo, mas respeita as mudanças na pele e cuida com atenção e consciência. É o tal do envelhecimento saudável, que propõe abordagens menos invasivas.

Nesse contexto, a principal dica citada por todas as dermatologistas, é o uso do filtro solar. “O principal responsável pelo nosso envelhecimento se chama sol. Ele é responsável por 35% a 80% do nosso envelhecimento. Então, se você puder desde criança usar protetor solar, eu te garanto que você vai manter a sua pele jovem por muito mais tempo”, afirma Stefanello.

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