“Até parece que morreu alguém da família…” ou “arrume outro que passa”. Essas são algumas das falas que quem convive com um bicho de estimação costuma escutar quando ele morre. Como se o luto pela morte de um pet fosse besteira. Isso em um país que figura na lista dos que mais têm mais lares compartilhados com animais de estimação.
“Cada vez mais a psicologia mostra que o sentimento pela perda de um pet é natural”
São 150 milhões de bichos de estimação no país, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). Um número que só cresce e coloca a nossa população, que gira em torno de 218 milhões de habitantes, entre as que mais são apaixonadas por essas criaturinhas.
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Nesse cenário, não deveria ser difícil compreender por que uma pessoa fica tão abalada com a morte do seu pet. Mas, para os que não entendem o tamanho dessa dor no outro, Alexandre Rossi, especialista em comportamento animal, explica: “Quando convivemos de forma muito próxima com um bicho de estimação, criamos um vínculo realmente importante. Eles estão conosco em momentos difíceis, trocando carinho e trazendo alegria ao lar”.
Se sentimos falta até de parentes com quem não tivemos tanta troca ao longo da vida, por que seria diferente com quem está quase sempre do nosso lado? “Cada vez mais a psicologia mostra que o sentimento pela perda de um pet é real e natural, e ninguém deve se culpar por isso”, afirma.
“Ainda não há empatia com o luto de quem perde um animal de estimação”
A psicóloga Bianca Gresele, presidente da Ekoa Vet (associação brasileira em prol da saúde mental na medicina veterinária), explica que esse sofrimento que bate quando perdemos aquele cãozinho ou gato que nos fez tão feliz é chamado de luto não reconhecido ou não autorizado.
“A sociedade em que vivemos é que estabelece o que é aceitável em diferentes áreas, inclusive no luto. Diante disso, muitos tutores não encontram reconhecimento do seu processo e têm dificuldade de expressar seus sentimentos, podendo até se sentirem constrangidos”, explica. “Isso é algo que percebo muito na clínica e em hospitais veterinários. No contexto social, não há empatia e acolhimento. O preconceito ainda predomina.”
É preciso entender que a possibilidade de laços que esses animais desenvolvem com seus humanos são inimagináveis. Antigamente, a maior parte dos cães não passava da porta da cozinha, ficando restrita aos quintais e jardins das casas. Com o tempo, e aquele jeitinho irresistível, eles foram conquistando seus lugares nos lares, dividindo a rotina e até a cama, impactando diretamente o estilo de vida de seus tutores.
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Em muitos casos ocupam o lugar de filhos que não foram concebidos ou que cresceram e não dividem mais o mesmo teto. Ou seja, esses seres adoráveis desempenham vários papéis na vida das pessoas, ajudando a suprir parte de suas carências e necessidades emocionais. Eles trazem segurança, calma em situações de ansiedade, ajudam a reduzir o estresse e, por isso, estão cada vez mais no centro da rotina da casa.
Viver o luto
Um cão vive em média entre 14 e 16 anos – e um gato pouco mais que isso. Se a vida seguir sem nenhuma intercorrência, seu pet deve partir antes de você. Para lidar com a perda de um animal querido, ou até mesmo o envelhecimento ou doença, a primeira coisa a fazer, segundo especialistas, é acolher essa tristeza e encontrar formas de aceitar essa modificação que acontece no nosso mundo.
É importante viver o luto, seja lá ele qual for. Outra coisa que pode ajudar neste momento é procurar uma rede de apoio, conversar com pessoas que passaram pela mesma situação e que vão entender sua dor. Uma atitude recorrente (e considerada polêmica) é logo pegar outro animal de estimação, como que para substituir o que se foi para pôr fim àquela angústia.
“A substituição imediata por outro animal pode ser frustrante”
“Na maioria dos casos, não recomendo que o pet seja prontamente substituído por outro”, sinaliza Bianca. “Do ponto de vista psíquico, é recomendado primeiro vivenciar a dor e só depois avaliar a possibilidade de trazer outro animal para casa. A substituição imediata pode ser frustrante, porque cada pet é diferente do outro, com outros comportamentos. O carinho e a emoção serão diferentes”.
E voltando àqueles que não entendem e até zombam da tristeza de quem está de luto pela morte de seu bicho de estimação, Alexandre dá a letra: “Se você está próximo de uma pessoa que está sofrendo, mesmo que não compreenda tão bem a situação, precisa entender que é um sentimento genuíno – respeitar e acolher. É importante desenvolver empatia (a capacidade de se colocar no lugar do outro) para tudo na vida”, finaliza.