Lua Menezes: chorar no sexo - Mina
 
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Chorei no meio do sexo e foi libertador

A escritora Lua Menezes conta como foi se abrir para o amor (pela vida) depois de um tempo fechada, traumatizada. E isso aconteceu no meio da transa.

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Ele ainda estava dentro de mim quando transbordei. Foi o dia em que tudo ruiu. Mas antes de falar da ruína, preciso explicar a fortaleza e, antes da fortaleza, preciso explicar a dor, contar que houve um abandono, um término dolorido, lágrimas derramadas, e uma longa jornada de juntar cacos e compor curas.

Mas a jornada valeu cada passo, cheguei no destino desejado: me vi verdadeiramente feliz comigo, sem procurar a próxima paixão que me distraísse, porque na verdade eu já estava apaixonada – pela vida, pelo meu trabalho. Nessa época eu trabalhava como terapeuta tântrica e orgástica em São Paulo, mas sou nascida e criada na terra de sol e a sede de mar era grande, todo mês eu inventava de atender no Rio de Janeiro, pra matar a saudade do mar.

Numa dessas idas, fiquei com Leo, um carioca bronzeado, de sotaque malemolente. Nos primeiros encontros, eu até estava gostando dele, do jeito como ele me tratava, dengoso, gentil, safado, mas ao mesmo tempo me mantinha emocionalmente distante, olhando pra ele como que do alto de uma fortaleza, protegida por muralhas invisíveis, mestre da arte da resistência – parecia confiança, mas era muito mais medo de me machucar. E se eu deixasse ele entrar e ele bagunçasse tudo? E se eu deixasse ele entrar e ele fosse embora?

Lento e constante ele achou o caminho até o ponto que me desarma 

Essa consciência ainda não era clara, eu não percebia o quanto mantinha Leo à distância, foi só na terceira vez que voltei pro Rio, quando minhas águas romperam a fortaleza, que entendi o quanto estava resistindo. Era de manhã cedo quando a gente começou a transar, eu estava de bruços e ele entrou devagarinho em mim, sem pressa, sem aperreio, sem atropelamento, com ritmo de banquete, de quem tem tempo no paraíso.

Lento e constante ele achou o caminho até o ponto que me desarma, foi me amolecendo por dentro, não sei bem como aconteceu, aliás, sei sim, lembro dele todo dentro e eu com um bullet no clitoris, lembro de estar tão presente no meu corpo, tão presente em cada sensação, de sentir a tensão do orgasmo se acumular até o ponto em que não cabia mais em mim – e deixei jorrar.

Eu, que fazia tanto pra estar no controle de tudo, num alívio extático me deixei tombar como um monumento que não suporta mais o esforço de se manter em pé, como uma torre que quer voltar a ser poeira, se dissolver de novo na areia do tempo, numa entrega tão absurda, de carne e espírito e tudo que a gente não entende.

O orgasmo veio com força de rebentação, subiu do ventre pro peito e comecei a chorar copiosamente. Ele parou, assustado, preocupado, perguntou se estava tudo bem, se tinha me machucado, mas aquilo que estava sentindo era justamente o contrário, era uma pequena grande cura.

No meio de gozo e lágrimas, percebi o que eu tinha enrijecido e parei de resistir, percebi que estava me apaixonando e me dei a permissão, me entreguei e chorei por toda a verdade daquilo. Chorei porque o amor me tocou fundo e me dei pra ele.

Sim, essa é uma história de amor, mas não é sobre Leo. A minha história com ele não foi adiante (nos encontramos de novo anos depois, mas esse é um outro capítulo). Essa história de amor é sobre a coragem de se abrir pro risco que é sentir.

Sim, é sempre um risco – derrubar fortalezas é encontrar a própria vulnerabilidade. Mas foi só quando a fortaleza ruiu que aprendi que eu não era tão frágil quanto pensava, até com as quedas eu era capaz de lidar. Com a fortaleza erguida, eu até me protegia, mas não me conectava, não passava da superfície.

Sim, sei que o mundo é perigoso e certas proteções são necessárias, mas neste dia percebi que não quero me proteger de sentir, muito menos de amar – esses são os riscos que quero viver.

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