Ana Paula Padrão: “As expectativas sociais que intimidam as mulheres precisam parar”
Ser mulher em 2022 não é fácil fácil. Os salários continuam mais baixos que os dos homens, a violência contra as mulheres cresceu durante a pandemia e os nossos direitos estão cada vez sendo mais contestados. Para refletir sobre isso, Angélica recebe a apresentadora e jornalista Ana Paula Padrão. Além de brilhar no Masterchef, ela também comanda a empresa Tempo de Mulher, que investiga o nosso papel na sociedade brasileira.
Como jornalista, Ana Paula pode ver de perto as condições das mulheres em diferentes lugares do mundo. Para ela, mesmo com todos os dilemas enfrentados no Brasil, ainda temos mais liberdade que as que vivem em países onde as imposições religiosas sobre a mulher são especialmente duras. “O nosso país tem muito o que avançar, mas a história se faz num passo que a gente só acompanha se usa uma lente muito aberta”, avalia.
“As pessoas têm que ficar constrangidas de intimidar uma mulher”
A apresentadora lembra que grande parte das conquistas femininas por aqui, são recentes. No começo do século passado, as mulheres não podiam votar no Brasil, nem receber herança ou optar por um trabalho sem autorização do marido e do pai a gente vê que avançou muito, ressalta. “Tem muita coisa para fazer ainda? É lógico que tem, mas eu sou otimista, levanto todo dia da cama achando que o dia de hoje vai ser melhor que o de ontem e trabalhando nesse sentido também”, diz.
Por outro lado, Ana Paula reconhece que libertar de determinadas amarras culturais foi um processo longo e teme que esse avanço seja perdido. “Estamos passando por um processo de profundo conservadorismo de novo. Tenho medo que de uma hora para outra a sociedade traga de volta coisas que a gente já tinha ultrapassado”, confessa. “As pessoas têm que ficar constrangidas de intimidar uma mulher ou de forçá-la a seguir um caminho que é apenas uma expectativa social e não uma escolha dela como indivíduo”.
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E entre todas essas pressões sociais, uma das mais fortes é a de ter filhos. Ana Paula passou por isso e, ainda assim, optou por não ter filhos. Há um tempo, ela escreveu sobre sua decisão no Instagram e o post viralizou. “Para mim, foi um susto a repercussão. Não era a minha intenção destampar uma caixa de Pandora, mas foi o que aconteceu”, diz. No dia seguinte, várias mulheres a abordaram nas ruas para agradecer pelo texto, pois foi com ele que refletiram pela primeira vez se realmente queriam ter filhos ou se era uma ansiedade causada pela expectativa alheia. “Quando você fala ‘não quero ter filhos’, é imediatamente taxada de egoísta, pouco feminina ou vão para um lado bastante religioso: ‘mas essa é sua função na Terra, procriar'”, conta.
“Assim como você estuda gramática ou matemática, é importante estudar você mesmo”
Esse autoconhecimento tão grande é reflexo de mais de dez anos deitando no divã. “Assim como você estuda gramática ou matemática, é importante estudar você mesmo”, diz Ana Paula, que não frequenta mais o analista, mas segue refletindo sobre suas questões pessoais com as ferramentas desenvolvidas naquele período. “Uma pessoa que se conhece toma decisões melhores sobre a própria vida, porque ela sabe fundamentalmente o que a faz feliz.”
Já reparou como é comum as mulheres encontrarem a felicidade nas conquistas de quem ela cuida? Quando o filho passa de ano na escola ou o marido vai bem no trabalho e fica livre no final de semana. Isso acontece porque somos educadas a seguir a agenda do outro ao invés de ternos a nossa própria, defende a apresentadora. “Esquece que existem outras pessoas no mundo. O que faz você feliz? Você gosta de cozinhar? De dançar? Demora para uma mulher responder a essa pergunta.”
Olhando para a própria trajetória, Ana Paula conta que aos 25 anos não usava decote e que seu guarda roupa só tinha roupas de cores neutras. Essa escolha era uma forma de se adequar ao mercado de trabalho que, na época, era majoritariamente masculino. “Eu tenho um pouco de vergonha de dizer que copiei os homens para entrar no mercado de trabalho. Tomara que toda essa geração de mulheres que se masculinizou nos anos 1980 para ser aceita e reconhecida como profissional sirva para que as mulheres de 25 não precisem fazer isso hoje.”