Fonte inesgotável de prazer e porta de entrada do aparelho reprodutor feminino, a vagina ainda hoje é cercada de mistérios. É tanto tabu e desinformação que cercam a sexualidade das mulheres que é difícil estabelecer uma relação aberta e saudável com nossas partes íntimas.
Desde cedo, muitas meninas aprendem que tocar a vagina é algo “errado, sujo”, e que deve ser evitado. As mulheres, então, crescem sem criar intimidade com o próprio corpo. Quantas delas nunca tiveram a curiosidade de pegar um espelhinho e olhar a própria vagina?
“A vagina tem o cheiro da nossa pele. Cada pessoa tem o seu. Não existe padrão”
Aproveitando o estigma do órgão sexual feminino ser “sujo” e “feio”, uma enorme quantidade de produtos que prometem diminuir e disfarçar o odor vaginal são lançados, prova de que a sociedade ainda não sabe lidar com o corpo feminino – nem as próprias mulheres.
Uma pesquisa realizada em 2015 em São Paulo pela empresa Sex Wipes, com 1.252 homens heterossexuais e sexualmente ativos de 18 a 30 anos, mostrou que 43% (4 em 10) não fazem sexo oral nas parceiras – embora 78% afirmem receber. Dos que praticam nas companheiras, 35% dizem não gostar. O motivo? Nojo da aparência, do cheiro e da umidade da vulva. Oi?
“Se toda mulher tem odor na região íntima e essa é uma característica natural e fisiológica, por que tantas têm vergonha do próprio cheiro?”, questiona a dra. Albertina Duarte Takiuti, mestre e doutora em ginecologia. “A vagina tem o cheiro da nossa pele. Cada pessoa tem o seu. Não existe padrão. Se a pessoa está saudável, o cheiro da vagina é equivalente ao do hálito. De modo geral, por ter um pH ácido, tem um odor e, principalmente, um gosto meio metálico”, complementa.
Mudanças hormonais e até o tesão podem deixar o cheiro e o gosto da vagina mais intenso
Segundo Carolina Rebello, ginecologista especializada em inclusão, saúde LGBTQIAP+ e reprodução assistida, hoje em dia, com a facilidade de acesso às informações, a mulher está entendendo e assumindo cada vez mais seu corpo. “Mas ainda há uma estrada pela frente. Muitas se constrangem com o cheiro e com as secreções vaginais. A vagina é sempre úmida. É um órgão maravilhoso com todas as suas particularidades. Não tentamos fazer com que nossa boca fique sem saliva, por exemplo”, diz. “Mudanças hormonais, como menstruação e menopausa, alterações na flora vaginal, e até o tesão, que aumenta nossa lubrificação, podem influenciar no cheiro e no gosto, tornando-os mais intensos”, sinaliza Carolina.
Secreção autolimpante
A ação hormonal interfere na microbiota – conjunto de bactérias que protegem as mucosas de infecções – e nos nossos cheiros. O pH sofre mudanças sutis ao longo do ciclo, ficando menos ácido durante o período fértil. O que comemos também pode fazer diferença. Alimentos mais fortes – como alho, café, carne vermelha, brócolis – em excesso e substâncias como álcool e cigarro podem deixar o gosto mais forte. Por outro lado, o consumo de frutas tende a deixar nossa vagina mais adocicada.
E para melhorar, nossa vagina é autolimpante. Graças à tal microbiota – essencial para a saúde dos nossos órgãos sexuais e reprodutores –, o canal vaginal consegue se limpar sozinho por meio das próprias secreções. Aliás, é essa aquela secreção que muitas vezes fica na calcinha no fim do dia.
Por essas e outras, na hora do banho, evite ducha interna, porque tira as bactérias que previnem o surgimento de infecções. Para deixar a pepeka limpinha e saudável, basta lavar a parte externa da vulva com água e sabonete, de preferência neutro ou de glicerina, ou apenas com água e o atrito suave da mão. “Um truque para deixar a vagina com sensação mais fresca, no caso de quem faz questão disso, é colocar uma gota de óleo de Melaleuca na parte de baixo da calcinha, que fica em contato com a vulga. Mas evite perfumes e afins que podem causar alergia”, indica a ginecologista.
Ficou menstruada? A higiene íntima não precisa ser alterada, mas, é indicada a troca de absorventes internos ou externos com frequência; caso contrário o sangue se acumulará no absorvente, podendo ocasionar mau cheiro. Uma boa saída é o coletor menstrual.
De olho no autocuidado
Também é importante ficar atenta aos sinais de que alguma coisa pode estar errada com a sua saúde. Cheiro forte, diferente do habitual – daí a importância do autoconhecimento –, pode sinalizar diversas doenças, inclusive as sexualmente transmissíveis. Coceira, corrimento amarelado ou verde, sangramento fora do periodo menstrual levantam a bandeira vermelha e uma visita urgente ao ginecologista se faz necessária. Lembrando mais uma vez que o corrimento deve ser transparente ou esbranquiçado, e ter odor leve.
Fato é que, se estivermos saudáveis e com a higiene em dia, não há motivo algum para nos sentirmos constrangidas com a nossa querida e incompreendida vagina. Ela é o que é, fonte de prazer e parte imprescindível no processo reprodutivo. Quer importância maior do que essa? Agora, se seu parceiro ou parceira ficar se esquivando na hora do sexo oral, o melhor é mandar um papo reto: “Conversar para tentar entender por que não rola o oral, se esse é um limite que a outra pessoa tem e não tem nada a ver com você. Sempre digo que sexo se acerta na conversa”, finaliza Carolina Rebello.