Qual é o lado bom da raiva? - Mina
 
Suas Emoções / Reportagem

A raiva como combustível de criatividade

Se organizar direitinho, (quase) toda raiva pode ser bem direcionada. Como? Renata Hilario nos convida a dar um duplo twist carpado para usar esse sentimento tão potente como energia de criação – e não de destruição

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O que há de errado com a raiva? Essa foi uma das colocações feitas pela filósofa, professora e ativista Angela Davis em sua passagem pelo Brasil em 2019. “A raiva pode ser um problema quando é mal direcionada, mas a raiva quando é bem direcionada nos ajuda a progredir”, pontuou. Raiva, entre tantos significados, é também um sentimento de protesto diante do que está posto. E o que está posto, serve a quem? Dialoga com quem? Foram muitos desses questionamentos e indignações que moveram algumas pessoas a reescreverem suas histórias e consequentemente a impactarem outras.

Entre a raiva e a criatividade, muitos sentimentos podem nos paralisar e outros serão combustível para alçarmos novos voos. Como diria a poeta Erin Hanson: “There is freedom waiting for you, on the breezes of the sky. And you ask what if I fall? Oh, but my darling, What if you fly?. (Há liberdade esperando por você, na brisa do céu. E você pergunta “e se eu cair? Oh, mas meu bem: E se você voar?).

Enxergar com clareza e deixar brotar a raiva bem direcionada é não nos diminuir para caber.

Algumas ferramentas nos ajudam a entender a raiva, como por exemplo nomear as coisas e situações como racismo, classismo, machismo, gaslighting, bropriating, mansplaining, manterrupting, entre outras. Nomear tais fenômenos e comportamentos sistêmicos nos faz ter consciência do que nos afeta. Ao materializar o problema e os diversos tipos de violências, derrubamos barreiras como o sentimento de culpa e a insegurança colocados pelos outros. Enxergar com clareza e deixar brotar a raiva bem direcionada é não nos diminuir para caber.

Longe de romantizar a dor, a proposta é que a raiva impulsione você a olhar pra dentro de si, a se ouvir, a acreditar na sua intuição e a se mover para transformar. Se criatividade vem da capacidade de imaginar, inventar e produzir, experimente somar isso à raiva bem direcionada.


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E se eu disse que é importante nomearmos, também afirmo que é importante questionarmos. Seria a segunda ferramenta: questionar sempre o que está posto e não silenciar, principalmente aquele barulho interno que por vezes a gente reprime por depender da validação alheia. Nosso silêncio serve a quem? Isso é também sobre os “nãos” que colhemos no caminho. Provavelmente as pessoas que você mais admira colecionaram pedras para construir seus castelos, foram desacreditadas e, sem plano B, apostaram no que acreditavam e, sem romantizar, colheram os frutos e seguiram na sua verdade.

De Beyoncé à Viola Davis: aprenda com a cultura negra

Se nomear e questionar são ferramentas, desconstruir e reaprender por outras perspectivas são terreno fértil no processo. Quem disse que a raiva criativa também não flerta com o amor? Eis mais um aprendizado com a cultura negra. Dario Calmese, fotógrafo e fundador do Instituto Black Imagination, fala sobre a importância de “reimaginar” e recontar a história por outros ângulos, transformando símbolos de dor em outras narrativas, como por exemplo sua capa na Vanity Fair com Viola Davis. Em seu Instagram, Calmese escreveu: “Welcome to my Protest” (“Bem-vindo ao meu protesto”), depois de revelar que a pose de Viola foi inspirada na imagem de “Peter Chicoteado”, um escravo que fugiu de uma plantação da Louisiana em março de 1863 e mais tarde ganhou liberdade.

Beyoncé, em um dos seus discursos simbólicos para uma turma de formandos nos EUA, ressaltou que nossos corações, quando direcionados a uma ação, podem dar início a mudanças. É sobre o valor de ser autêntico, tomar as rédeas do próprio caminho e apostar em si, isso por vezes é o melhor que se poderá fazer para sua autodescoberta.

Ela relembra: “Poucas mulheres negras tinham um lugar na mesa, eu tive de talhar a madeira e construir a minha”. Assim como Angela Davis, Beyoncé reforça que foi necessário remover o véu da conciliação para quem se sente desconfortável com a nossa excelência. “Não importa o que façam, é fundamental não deixarmos que a negatividade das projeções alheias desvie nosso foco.”

Para a Queen B, perder pode ser a maior motivação para vitórias maiores. Ao apostarmos em nós, estaremos investindo no nosso próprio futuro. Fiquem atentos às suas intenções, não deixem distrações ou inseguranças atrapalharem seus objetivos, ela disse. E concluiu destacando que este é um momento crucial, o planeta está arrancando os curativos para que vejamos nossas feridas, para que possamos reconhecê-las e tratá-las. É aí que começa a verdadeira cura. Podemos ser os líderes de que o mundo precisa. Que você possa despertar a sua raiva criativa.

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