Laqueadura antes dos 30? Cada vez mais jovens mulheres estão fazendo a cirurgia - Mina
 
Seu Corpo / Reportagem

Laqueadura antes dos 30? Cada vez mais jovens mulheres estão fazendo a cirurgia

Desde março de 2023, a lei permite que mulheres a partir de 21 anos possam fazer o procedimento anticoncepcional. Vem que a gente te explica como funciona.

Por: e
5 minutos |

Você é ou conhece alguém que decidiu que não queria ser mãe muito cedo na vida? Aos 14 anos, a lojista Julia Vitoria tomou essa decisão porque já sabia que não queria cuidar de crianças. É por isso que, assim que a legislação brasileira reduziu de 25 anos para 21 anos a idade mínima para mulheres (e homens também) para fazer a “esterilização” voluntária (lei nº 14.443/2022), ela foi atrás da papelada do SUS (Sistema Único de Saúde). Sem nunca ter tido filhos, Julia conseguiu fazer o procedimento um ano depois, aos 22.

A laqueadura também é oferecida em clínicas particulares, e o preço varia de R$ 5 mil a R$ 50 mil, dependendo dos custos hospitalares. Em vigor desde março de 2023, a lei que ampliou o acesso e delimitou prazos de espera também suspendeu a necessidade de consentimento do parceiro para aprovação da laqueadura ou vasectomia (sim, até o ano passado tanto mulheres quanto homens precisavam da assinatura do parceiro ou parceira).

“Não tenho medo de me arrepender. Nem todo mundo tem estrutura psicológica, financeira ou emocional para colocar um filho no mundo”, diz Julia, que também usa anticoncepcional e DIU caso algum dos métodos falhe. Não conhecendo mais ninguém que fosse laqueada na faixa dos 20 anos, ela divulgou as etapas do procedimento no TikTok e descobriu que não era a única mulher jovem e sem filhos interessada na cirurgia.

A laqueadura é uma esterilização permanente feita em pessoas com útero 

A laqueadura de Julia foi feita por meio de videolaparoscopia — são feitas pequenas incisões no abdômen, sendo uma delas no umbigo para introduzir uma câmera, e outras para a inserção de pinças. A cicatriz é mínima (furinhos discretos) e a recuperação dura cerca de 15 dias. Há outros métodos disponíveis na medicina e cada caso deve ser analisado individualmente.

Bê-a-bá do procedimento

Se você pensa em realizar uma laqueadura é necessário algumas informações. Primeiro, o procedimento é nada mais que uma esterilização permanente feita em pessoas com útero.

Para fazer a laqueadura, os exames pré-operatórios variam. Avaliação cardiológica, exames de sangue, papanicolau e ultrassonografia transvaginal são alguns dos que podem ser pedidos na consulta. Mas o teste de gravidez negativo é obrigatório.

A cirurgia pode ser feita de duas maneiras: a primeira e mais comum, segundo a Dra. Tatiane Boute, ginecologista do Fleury Medicina e Saúde, é feita com cortes nas tubas uterinas. Cada extremidade é amarrada, impedindo que o esperma chegue até o óvulo e ocorra a fecundação.

Falha na laqueadura é rara, mas pode acontecer: 100% de eficácia só com abstinência 

Outro método é a retirada das tubas, ainda mais eficaz, mas irreversível. “As formas de se chegar até as trompas para fazer a laqueadura, além da videolaparoscopia, são a técnica aberta (um corte abdominal é feito no mesmo local em que se faz o parto por cesárea) ou por via vaginal (um corte é realizado no fundo da vagina)”, prossegue a médica.

Vamos falar dos riscos?

É importante dizer que a cirurgia não é para todo mundo. Tatiane explica que pessoas com alto risco cirúrgico, como hipertensão ou diabetes descompensados, não são aptas para o procedimento. Apesar de baixíssima, a possibilidade de infecção, hemorragia e trombose não é inexistente.

“Há riscos, como toda cirurgia invasiva”, concorda a ginecologista Rebeca Garaude, formada pelo Hospital Pérola Byington. A médica também aponta que “por causa do corte, pode ocorrer uma pequena lesão nos vasos sanguíneos que irrigam os ovários. Isso causa alterações menstruais, como fluxo e cólicas mais intensos”.

Vale ressaltar que não existe nenhum método que nunca falhe. “A falha da laqueadura é rara, mas pode acontecer. O único método 100% eficaz é a abstinência sexual”, complementa Rebeca.

Alívio e autoconhecimento

Parar de tomar a pílula anticoncepcional era o principal motivo para a balconista Aline Siqueira, 27 anos, optar pela laqueadura em uma clínica particular há um ano. 

Casada há seis anos e sem nunca ter desejado filhos, ela mantinha cuidado redobrado durante o sexo aliando a pílula ao preservativo. Por usar o remédio há anos, sentia que não se conhecia. “Queria entender como era meu corpo sem a influência daqueles hormônios sintéticos. Tem gente que não sente nada, mas é só ler a bula para saber que não é coisa boa.”

“Disseram que eu tinha acabado com a vida do meu marido”

Enquanto estava em repouso por 14 dias, um dos maiores desafios foi lidar com comentários após o procedimento. “Disseram que eu tinha acabado com a vida do meu marido, que não me sentiria realizada sem ser mãe e até que eu não gostava de crianças”, desabafa. Sim, aquela dose de machismo puro na veia.

Aline conta que conheceu o parceiro aos 16 anos, que a vontade de não ter filhos era compartilhada desde o início da relação e que se sente feliz com a decisão. “Eu amo meus sobrinhos e minha afilhada. Aliás, eu amo essa criança de um tanto, que poderia não querer ela nesse mundo superpopulado e difícil”, brinca.

Mais lidas

Veja também