O que as plantas têm a nos ensinar para 2023 - Mina
 
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O que as plantas têm a nos ensinar para 2023

As plantas são 85% de toda a vida que existe na Terra, o que mostra que a lógica predador-caça não é tão benéfica para quem se sente no topo da cadeia. É muito mais inteligente cooperar do que competir

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O modelo da relação predador-caça serve de base ou inspiração para quase toda nossa organização social, afetiva e profissional. Segundo esse modelo, a competição pretende ser a dinâmica que rege quase tudo. Um irmão melhor que o outro, um funcionário melhor que o outro, um namorado mais apaixonado que o outro. O melhor, o mais forte, o mais rico e o mais bonito parecem destinados a ocupar o topo da pirâmide dessa imensa cadeia alimentar que hierarquiza tudo e todos. Eu mesma cresci ouvindo que “primeiro lugar só tem um”. Nesse sentido, alcançar o topo é, ou deveria ser, a meta de todos os animais vivos. Sim, talvez para os animais, sim.

Para aguentar ventos fortes as árvores se apoiam umas nas raízes das outras 

Porém, quando pensamos em termos de vida sobre a Terra, o reino animal não é o único – nem de longe – o mais bem sucedido. Basta pensar que os animais correspondem a 0,3% da biomassa do planeta, enquanto o reino vegetal corresponde a 85% de toda vida que existe sobre a Terra – sendo o resto de fungos e outros micro-organismos. Baseado nesse cenário, pense bem: quem adotou as estratégias mais eficientes de sobrevivência? Parece que as plantas, não? Mesmo assim, todos os nossos estudos, parâmetros e muito da nossa ética e moral têm como base o modelo do Reino Animal com sua dinâmica predador-caça.

Para a maioria esmagadora das pessoas, as plantas são seres inanimados ou decorativos e a ideia de aprender com elas soa absurda. Mesmo os mais bem intencionados, ao lerem esse texto, devem agora estar pensando: “Eu até gostaria de aprender com as plantas, mas… hããã?”

Vamos voltar no Tempo. Voltar muito. Quando a vida começou na Terra, plantas e bichos fizeram escolhas opostas sobre como superar as questões básicas de sobrevivência: alimentação, procriação e segurança. Os animais optaram por serem móveis e as plantas escolheram ficar em um mesmo lugar, ou seja, são seres sésseis. Os animais conseguem alimento através da caça e coleta (e depois da criação de animais para abate e agricultura), enquanto as plantas desenvolveram a fotossíntese e com isso são capazes de produzir o próprio alimento a partir da luz do Sol! 

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Sem saírem do lugar, as plantas desenvolveram estratégias de polinização, por exemplo, usando o vento, a chuva e os animais, incluindo o Homem como transportadores de sementes. Esses seres tidos como inanimados são capazes de se proteger de predadores com diversas técnicas, como tornar a seiva amarga e afastar uma lagarta ou uma girafa, por exemplo. Ao mesmo tempo, a árvore atacada avisa às outras árvores sobre o predador iminente. Assim, mesmo as árvores que não foram mordidas tornam sua seiva amarga. Por isso, as girafas na África se alimentam de uma porção da floresta e depois cavalgam até 70 km em busca de árvores desavisadas, com seiva doce, para dar o próximo bote.    

Ao contrário do que pensamos, as plantas não são imóveis; existe registro de florestas inteiras que “andam”. As plantas se comunicam através de partículas liberadas e captadas por outras plantas e, sobretudo, através de suas raízes e fungos parceiros. Algumas plantas até “veem” através de ocelos e por isso são capazes de mimetizar outras espécies, muitas vezes em busca de proteção. Árvores-mãe nutrem e educam seus filhos, por exemplo, fazendo sombra sobre eles e obrigando-os a crescer lentamente, o que garantirá à jovem árvore um tronco mais robusto e firme. 

No Reino Vegetal, o que rege as interações é um profundo senso de cooperação

As árvores se apoiam umas nas raízes das outras, por baixo da terra, contra os ventos fortes. Durante a ventania, no Reino Vegetal, ninguém solta a mão de ninguém. Mais ainda: quando uma árvore fica doente, seja por um galho quebrado ou ataque de besouros, as árvores vizinhas lhe fornecem nutrientes através das raízes. Elas entendem que é muito melhor ter uma vizinha saudável com quem trocar proteção e nutrientes do que deixar à mingua aquela velha conhecida. Imagine o que significa uma má vizinhança para um ser vivo que não pode “sair andando”.

Outra coisa que chama a atenção é que a nossa forma de organização segue o modelo da nossa fisiologia animal. Estruturamos nossa sociedade, nossas instituições e nossas casas segundo o princípio de um centro controlador (o cérebro) e departamentos especializados (os órgãos). Assim, quando um organismo animal é lesado em uma parte de sua anatomia, caso tenha a sorte de sobreviver, aquela função estará para sempre comprometida. Com as plantas se passa quase o oposto. Quem nunca viu um galho quebrado brotar? Ou uma raiz decepada dar origem a toda uma nova árvore? Apesar da especialização das partes –raízes, caules e folhas–, cada parte da planta contém em si toda informação e potência de que precisa para executar as outras funções. Cada parte de uma planta contém toda a inteligência para sobreviver daquele ser.

Portanto, as plantas não têm um “centro de controle” definitivo, mas sim um sistema de células autônomas com potencial infinito, que trabalham em um regime de organização flutuante de cooperação. Isso é mais do que fisiologia vegetal, é uma proposta de sistema organizacional descentralizado. No Reino Vegetal, não é a dinâmica de predador-caça que rege as interações, mas sim um profundo senso de cooperação. E foi assim, pensando diferente de nós, animais, e agindo em conjunto que as plantas dominaram o planeta.

Talvez a gente tenha algo de fundamental para aprender com elas neste 2023 que está chegando!

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