Nátaly: "Para cuidar, é preciso estar bem consigo mesmo" - Mina
 
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Nátaly Neri: “Para dar e receber cuidado, é preciso estar bem consigo mesmo”

A cientista social compartilha com Angélica como foi seu processo de conquista da autoestima apesar do racismo e como isso impacta na sua criação de conteúdo

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Ter a autoestima elevada não é tarefa fácil. E esse processo costuma ser ainda mais complicado para as pessoas negras em comparação às brancas. Se alguém não se encaixa no padrão de beleza ridiculamente limitante, que valoriza pele branca, corpo magro e cabelo liso, acaba se sentindo inadequado. Para refletir sobre isso, Angélica recebe Nátaly Neri, criadora de conteúdo e cientista social que há 7 anos leva centenas de milhares de seguidores a pensarem  sobre moda, beleza, sustentabilidade e veganismo, sempre por meio da lente da raça e do gênero. 

Para Nátaly a gente só consegue se cuidar e cuidar do outro quando estamos bem com nós mesmos. “Você precisa ter o mínimo de amor à vida pra querer manter ela acontecendo de uma forma saudável”, frisa. Quando estamos passando por necessidades urgentes, como é o caso de determinadas minorias, isso acaba não sendo prioridade. “Na  verdade, o cuidado acaba sendo uma medida paliativa para você reduzir violências. Vou cuidar do meu cabelo ou da minha aparência para sofrer menos preconceito e nunca é para que eu goste mais de mim”, reflete.  

“O meu processo de encontro com as teorias feministas negras foi de coletividade e de fim de uma grande solidão”

Ter contato com o feminismo negro foi muito importante para que Nátaly se conectasse com a sua autoestima. Diferentemente do que acontece hoje em dia, ela não tinha contato com questões ligadas ao movimento na época da escola. “A gente não falava de assédio, de autonomia, de consentimento”, relembra. Só quando foi estudar Ciências Sociais que ela teve acesso a esses conceitos. Em coletivos e grupos de reflexão, ela acabou se conectando com pessoas que passavam pelo mesmo processo que ela. “Foi como me ver em espelhos, me enxergar em alguém e não me sentir mais sozinha. O meu processo de encontro com as teorias feministas negras foi de coletividade e de fim de uma grande solidão.”

Mesmo sendo um país diverso, o Brasil tem como padrão de beleza a pele branca. Então Angélica pergunta como a cientista social faz para se sentir bonita apesar dessa imposição, e ela relembra a dificuldade que foi para tomar coragem de fazer dreads no cabelo,mesmo tendo muita vontade  “Achava que as pessoas não iam me respeitar devido a vários preconceitos que, além de mentirosos, são muito prejudiciais para pessoas negras”, diz. 

Ela só encontrou essa liberdade quando se tornou influenciadora, uma área que visualmente tem mais autonomia. Depois veio a dificuldade de encontrar informações sobre como cuidar desse cabelo, por isso ela faz questão de produzir conteúdos sobre o tema para que outros tenham referência. “O que a gente construiu na internet foi essa grande aula em que a gente compartilha o que sabe, aprende o que não sabe, e vai se fazendo junto com o outro. Para as mulheres negras, talvez tenha sido o primeiro momento na história que a gente conseguiu se conectar de forma tão ampla”, celebra. 

“Quando percebo que estou sobrecarregada, dou um passo para trás e faço uma pausa”

Por outro lado, Angélica lembra que a internet acaba tendo um lado tóxico devido a cobranças e comentários negativos, o que acaba afetando a saúde mental de muitos criadores de conteúdo. “É difícil você não sentir nada quando você está se expondo para milhares de pessoas e essas pessoas sempre terem algo para falar sobre você”, relata. Quando nem sabia o que era burnout, ela tinha um método para lidar com ele, que costumava surgir a cada três quatro meses: “Eu percebia que eu estava chegando a uma exaustão psíquica e emocional, esperava ficar mal e aí parava uma semana. Hoje em dia, ao invés de esperar a corda arrebentar, quando percebo que estou sobrecarregada, dou um passo para trás e faço uma pausa.”

Quem vê a Nátaly esbanjando autoconhecimento, não imagina como era a sua autoestima na infância e na adolescência. “Eu não me reconhecia”, revela. “Eu me via como algo na vida de outras pessoas. Como uma amiga, filha, sobrinha… Nunca me olhei e falei: eu sou valorosa, eu sou incrível. Era sempre eu em relação a várias outras histórias.” Se pudesse dar um conselho para sua versão mais nova, a criadora de conteúdo diria para ela se olhar com mais carinho e se parabenizar, porque dava conta de muita coisa e não valorizava isso. “Parabéns por não ter desistido da gente, por ter se esforçado, por ter desejado algo a mais”, finaliza.

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