Letticia Munniz já deixou de sair pra não precisar comer. Já comeu tudo que viu pela frente, pra depois vomitar; foi viciada em laxante e teve desmaios recorrentes por ficar muito tempo sem se alimentar. Por anos, comer foi um martírio e mais que isso, habitar seu corpo era um sofrimento: “Sempre soube o que queria ser, mas também sempre soube o que não queria ser. E não queria ser eu, porque odiava meu corpo”, conta.
A fixação em ser magra e as perdas por causa disso começaram ainda na infância. Aos 10 anos, Letticia largou a ginástica olímpica, esporte que amava para não ser vista de collant porque os amigos zoavam sua coxa grossa. Ela revela que esse foi o ponto de partida para começar a se odiar.
A virada veio só quando já era uma jovem adulta e viu a modelo Ashley Graham no feed do Instagram. “Quase buguei por achar uma gorda bonita. Ia contra tudo que eu estava acostumada”. Mas foi Ashley posando plena em seu corpo que deu à Lettícia a possibilidade de existir sendo gorda.
Hoje, assistente de palco do Domingão no Hulck (Tv Globo), Lettícia inspira jovens a seguirem seus sonhos com o corpo que tem. Insiste na tecla de que as pessoas precisam se interessar por quem somos e não pela nossa imagem. Por meio de cinco fotos, a apresentadora conta sua longa jornada rumo ao amor próprio, ao auto respeito e ao sucesso.
“Gostava de ficar arrumadinha como a vovó fazia”
Nascida em São Paulo, mas criada no Espírito Santo, Lettícia se considera capixaba. Grudada na avó, a neta do meio confessa que seu jeitinho foi totalmente influenciado pela matriarca. “Sempre fui grudada na minha vó”, que era professora e sempre incentivou Lettícia a focar nos estudos. Como um jeito de retribuir toda dedicação, ela sempre foi uma aluna exemplar. Nessa época, já tinha apreço movimento e arte, tudo junto e misturado. Foi aos 7 anos que começou no balé, e dançou por três anos. “Eu era muito artística. Gostava de esporte e de dançar.”
Lettícia conta que adorava as produções feitas pela avó. Destaque para os vestidos de festa junina. “Essa franja com certeza foi ideia dela”, diz. “Ela gostava de vestir a gente como bonequinha e isso nunca foi um incômodo. Gostava de ficar arrumadinha como a vovó fazia”.
“Não queria ser eu, porque eu odiava o meu corpo”
“Eu sempre soube o que queria ser, mas também sempre soube o que não queria ser. E não queria ser eu, porque odiava meu corpo. Após os 10 anos, desenvolvi transtornos alimentares muito movida pelos comentários alheios. Ouvia direto ‘Você está gorda!’”
Aos 11 anos, se apaixonou pela ginástica olímpica. Ela conta que foi uma fase muito gostosa antes de começar a ter problemas. “Eu amava falar que não poderia ir em tal compromisso porque ia treinar”, lembra. O foco todo custou até uma parte da infância e da adolescência, totalmente dedicada à ginástica.
Mas, um dia, Lettícia não aguentou a pressão e desistiu. Sofria muito bullying. “Os meninos ficavam zoando me chamando de coxinha. Saí da atividade física que era minha paixão porque não queria ser vista com de collant. Foi aí que passei a odiar meu corpo”.
Esse afastamento forçado da ginástica deu início à compulsão alimentar e com ela ações desesperadas para emagrecer. No início da sua adolescência passou a tomar laxante com frequência e a fazer todo tipo de dieta que aparecia na internet, nas revistas e na escola. O objetivo era ser tão magra quanto uma amiga da classe. “Eu queria ter o corpo dessa menina”, conta. Para fugir do bullying, Lettícia recorreu ao humor. Me vestia de forma esquisita e fazia piada sobre mim mesma para que as pessoas não rissem de mim”, desabafa.
“Eu não tinha dinheiro para comprar laxante todos dias”
Recém chegada em São Paulo, Lettícia ainda sofria com a compulsão. Esse registro é de um momento em que ela faria um antes e depois. “Passava 24hrs do meu dia controlando tudo que eu comia”, diz. A todo momento ela calculava quanto precisava gastar para se manter mais magra possível. “Odiava meu corpo e sempre me achava gorda.”
A bulimia e o laxante seguiram frequentes na vida de Lettícia, sem ajuda profissional, a apresentadora só tinha um objetivo na vida: emagrecer. “Eu não tinha dinheiro para comprar laxante todos os dias, mas todos os dias eu vomitava”, lembra. Num ciclo vicioso entre ficar sem comer, comer de tudo que via pela frente e vomitar, ela não se sentia à vontade de falar sobre a questão com ninguém e por isso, viveu esse distúrbio alimentar por muitos anos.
“Eu deixava de sair pra não comer e não engordar”
A foto toda produzida foi no dia da formatura de uns amigos parece ter glamour, mas a história por trás é outra. O vestido foi emprestado de uma estilista que a Letícia como produtora, conseguiu entrevistar. Mas ao buscar a peça escutou teve que escutar a moça dizer que esse seria o único vestido ali que caberia nela.
“Quando olho essa foto, me sinto horrível, tenho pena dessa Letícia”, desabafa. A apresentadora conta que passou a noite toda sem experimentar absolutamente nada do buffet, e que isso era frequente. “Eu deixava de sair pra não comer e não engordar.”
Com pouco dinheiro e sem a família em São Paulo, era rotina para Lettícia passar mal. “Desmaiava todos os dias antes de ir trabalhar e na marmita só levava um ovo”, diz. Com o início do Instagram, a busca pela magreza só aumentou. Era acompanhando as musas fitness que Lettícia perseguia o tal corpo perfeito. “Sonhava com o dia que ia ter o corpo daquele jeito e poder comprar um shorts que ficasse folgadinho em mim.”
“Não é sobre o quanto estou pesando, é sobre quem eu sou”
Tudo mudou quando Letícia viu Ashley Graham no feed do Instagram. A modelo virou ícone por ser a primeira gorda a estampar uma tradicional revista de moda. “Quase buguei por achar uma gorda bonita. Ia contra tudo que eu estava acostumada”. Ao ver a modelo norte-americana maravilhosa, a atriz percebeu que existia a possibilidade de se amar e de ocupar locais de destaque sem ser magra. “Ela me deu a possibilidade de existir sendo gorda”.
Lentamente Letícia passou a compartilhar seus processos nas redes sociais. Ganhou seguidores e começou a ser admirada. “Elas têm intimidade comigo e me coloquei muito vulnerável”, confessa. Em busca de conseguir se admirar, ela passou a olhar para outras coisas, muito além do peso na balança. “Não é sobre o quanto eu to pesando, é sobre quem eu sou e por que me amo”.
Depois disso, foi um processo levar essa autoconfiança para as relações e entender no que, de fato, precisava investir para ser querida e respeitada. “Quero que as pessoas se interessem por mim porque sou foda, não pela minha imagem. Hoje eu construí essa mulher forte e potente”.