Menopausa: sintomas, silêncio e descaso
Você conhece o fogacho? Pois até o sintoma mais clichê da menopausa ainda não foi totalmente desvendado pela ciência
Todos os dias 6 mil mulheres entram na perimenopausa, mas o desconhecimento ainda parece enorme. “Peri o quê?” me perguntaram algumas interlocutoras quando puxei o assunto, meu atual monotema preferido com mulheres da minha idade. Me surpreendi com a falta de informação geral sobre uma fase tão intensa da nossa vida e busquei na memória… Há alguns anos passei a buscar mais e mais informação sobre menopausa e esse período que a antecede, a tal da perimenopausa. Foi quando tive os primeiros episódios de calores noturnos, na madruga boladona. Talvez fossem o anúncio de boas vindas da perimenopausa. Acordava com a blusa do pijama ensopada, achei que não estava acontecendo comigo. Mas estava, claro.
“Alguns estudos científicos sobre estrogênio, pasmem, foram feitos só com homens”
A menopausa se caracteriza por uma sequência de 12 meses sem menstruação. Tecnicamente, se a mulher ficou 12 meses sem menstruar, entrou na menopausa, o que acontece em média aos 51 anos. E até os 55 anos 91% das mulheres terão atingido esse marco. A perimenopausa é o período anterior, quando os níveis de produção de estrogênio e progesterona começam a variar. Começa por volta dos 40 anos, dura cerca de 7 anos, mas pode se prolongar por até 14.
Nessa fase, o ciclo menstrual pode ficar bem irregular, o que leva algumas mulheres a até a suspeitarem de que estão grávidas. Segundo os médicos, aos 47 ou 48 anos existe uma possibilidade de gravidez, mas é mínima. Então, amiga, provavelmente, você está na perimenopausa mesmo.
“Conhecimento é poder”
Os níveis de estrogênio e progesterona começam a cair em ondas, num sobe e desce que passei a chamar de “hormônios muito loucos”. Acontece que ainda sabemos pouco sobre eles e os impactos dessa queda de produção. E adivinha por que? Quem se importa com o funcionamento do corpo das mulheres, não é mesmo? O estrogênio foi isolado em 1929 por um cientista norte-americano chamado Edward Doisy, que ganhou até o Nobel por isso. A partir daí, foram desenvolvidas drogas e tratamentos absurdos e agressivos. Os estudos científicos ainda são poucos, bastante recentes e muitos deles, pasmem, foram feitos só com homens. Isso mesmo, há casos de cientistas que estudaram a variação do estrogênio apenas em corpos de homens. E foi outro dia, viu, ali pelos anos 1970.
Entre as dezenas de sintomas, um que virou clichê é o fogacho. “Os calores da menopausa” parecem bastante conhecidos, mas até hoje a comunidade científica não sabe exatamente como as mudanças hormonais desencadeiam as ondas de calor.
Tenho aprendido essas e muitas outras informações sobre a menopausa no livro “O que ninguém conta sobre a menopausa – um guia para entender e abraçar essa fase da vida”, da autora norte-americana Jancee Dunn. Até ela, que há 20 anos escreve sobre saúde, foi surpreendida e demorou um tempinho pra entender o que tava acontecendo com seu corpo. Foram episódios de insônia (outro sintoma bastante comum) e a menstruação atrasada que despertaram o alerta na jornalista de que, aos 45 anos, os hormônios dela estavam muito loucos.
Fala-se muito pouco sobre a qualidade de vida das mulheres nessa fase da vida, não temos nem vocabulário pra isso. No livro, a autora conta que a palavra “perimenopausa” apareceu pela primeira vez no léxico em 1962, mas não há nenhuma menção a ela até os anos 1990. Fiz um teste e joguei a palavra no dicionário online de sinônimos, não há. Usei a busca do dicionário Aulete e: “não foi encontrado o verbete “perimenopausa“. Pois é, em 2024. Ao menos o chat GPT sabe do que estamos falando.
“Pode existir um luto na constatação de que não somos mais as mesmas, mas é preciso celebrar a maturidade”
A menopausa não aparece no nosso entorno, na cultura ocidental hegemônica. Cadê a menopausa sendo abordada naturalmente, como uma condição biológica, em personagens de filmes e séries? E em livros? Onde estão as músicas contando histórias de mulheres que têm suas vidas impactadas pelas mudanças hormonais? Não existem. Assim, quanto menos falamos sobre ela, menos entendemos essa fase da vida, o que só faz crescer o preconceito e a aversão à menopausa, vista única e tão somente como o fim da idade reprodutiva da mulher e, portanto, do seu principal valor. Quando abordamos o envelhecimento, em geral responsabilizamos as mulheres a aguentarem os sintomas e dizemos que envelhecer é isso mesmo, sem entender porque eles acontecem e como podemos ter uma melhor qualidade de vida depois dos 40.
Olha essa lista de sintomas: ondas de calor, suor noturno, menstruação irregular, oscilações de humor, diminuição da libido, seios doloridos, dores de cabeça, secura vaginal, ardência bucal, queda de cabelo, formigamento nas mãos e nos pés, problemas na gengiva, fadiga extrema, inchaço, problemas digestivos, dores nas articulações, depressão, dores musculares, coceiras na pele, insônia, confusão mental, lapsos de memória, unhas quebradiças, ganho de peso, escapes urinários, tontura, vertigem, alergias, perda de densidade óssea, palpitações, irritabilidade, ansiedade e síndrome do pânico.
#ForaFogacho
Esses são indicativos comuns, mas acontece com cada mulher de um jeito. Posso listar os meus aqui: episódios de suores noturnos, névoa mental, falhas de memória, fadiga extrema, queda de cabelo, descamação das unhas, acúmulo de gordura na região abdominal, variação de humor, tpm intensa, ciclo irregular, ansiedade. Alguns estudos sugerem que eles podem variar de acordo com a raça. Outros apontam que as ondas de calor podem ser frequentes e impactar diretamente a qualidade do sono, que por sua vez atrapalha a formação de memória, absorção das informações e o descanso do corpo, eleva a produção de cortisol e pode levar ao ganho de peso. Mais: os níveis de melatonina também caem, o hormônio responsável por preparar o corpo para dormir. Quer dizer, ficamos mais suscetíveis a episódios de insônia. E a privação do sono pode ser enlouquecedora. Eu, nacionalmente conhecida pelo superlativo talento de dormir bem, faço orações diárias para as deusas me manterem assim.
Os especialistas sugerem que essa é uma ótima fase para mudar de vida: reduzir ou cortar o consumo de álcool, se alimentar bem, praticar exercício físico obrigatória e regularmente (o que impacta positivamente no sono). Gabaritei a lista. Essa ainda é uma boa hora para parar de fumar, o que também fiz há 6 meses, pela quarta e – espero – última vez. Entendi que, depois dos 45, acabou a brincadeira pra quem gosta e quer viver bem. Sonho que tô fumando e sinto muito prazer? Sim. Acordo e penso: faltam só 29 anos e meio para eu voltar a fumar com 76 e poder morrer em paz.
A menopausa não é o fim
Tenho entendido a perimenopausa como uma transição. Nos desprendemos de coisas, de possibilidades, de hábitos de vida, da juventude, de colágeno, de energia e de músculos. Pode ter até algum luto envolvido na constatação de que não somos mais as mesmas a partir dessas despedidas. Mas a maturidade também traz ganhos valiosos e é preciso celebrá-los. É bonita a fala da atriz e poeta Elisa Lucinda no podcast “Zen Vergonha”, apresentado pela Fernanda Lima. Elisa entende esta como mais uma fase da vida. “É como pegar o morto no jogo de buraco. Encerrou a primeira parte, agora tem uma nova etapa”, que vai ser diferente do que foi até agora. Ela fala em tesão de viver e eu sinto isso demais.
A maturidade me levou a buscar integridade, a investigar profundamente meus desejos e agir na direção deles. A segurança de si faz a gente largar uns pesos pelo caminho, parar de se importar com o que não importa; mudar de opinião; reinventar o erotismo; apreciar momentos de solidão; valorizar e descompartimentar as relações. Ando muito, muito a fim de criar, de viajar, de conhecer coisas, de me apaixonar e me surpreender.
E as melhores sugestões que posso dar, baseada no que andei aprendendo, são:
- Procure fontes seguras de informação, abaixo listo algumas.
- Procure um médico, de preferência uma médica, especialista no assunto (uma endócrino ou uma gineco, por exemplo), em quem você confie e que te explique direitinho os sintomas e a melhor forma de lidar com eles.
- Não fique sozinha; converse e troque informações e experiências com outras mulheres, essa união é muito poderosa para o nosso bem estar.
- Aproveite e saboreie os ganhos da maturidade, eles são valiosos.
Para ler:
- O que ninguém conta sobre a menopausa – um guia para entender e abraçar essa fase da vida, da autora norte-americana Jancee Dunn, Ed.Fontanar.
Para ouvir:
- Zen Vergonha, sobre Menopausa, série em podcast apresentada por Fernanda Lima.
- “Lust for Life”, Iggy Pop
Para seguir:
- @she_it: uma das minhas primeiras fontes de informação sobre menopausa.