Renata Andrade e Thais Pontes: amizade feminina - Mina
 
Seus Relacionamentos / Textão

Amizade feminina é um superpoder

Conheça história das roteiristas Renata Andrade e Thais Pontes, duas mulheres que sonharam alto juntas e, de mãos dadas, chegaram lá

Por: e
5 minutos |

Imagine duas adolescentes que passavam horas, ainda no tempo do telefone com fio, comentando novelas e séries? Pois é, éramos nós. Thais e Renata. Renata e Thais. “Quase nome e sobrenome”; “quase uma entidade”; “quase uma pessoa só” é o que muitos dizem… Não somos nada disso. Somos amigas. Amigas há mais de 27 anos, há tanto tempo que nem dá mais para lembrar como era antes desse encontro acontecer. Amigas apaixonadas pelo audiovisual e pela escrita antes mesmo da possibilidade real de trabalharmos como autoras. 

Éramos telespectadoras de um sonho que parecia impossível, mas que, com o tempo, foi se transformando em meta profissional. E o mais interessante: para as duas. Duas pessoas que, mesmo muito diferentes, já tinham muitas afinidades e olhavam na mesma direção. Uma direção que não parecia muito propícia para duas meninas negras que não tinham contatos que pudessem abrir portas. E é aí que, além da persistência, entra o poder do incentivo que uma já dava à outra. Afinal, nem sempre as duas estavam ao mesmo tempo otimistas em relação a um objetivo que parecia inalcançável. Será que havia um lugar para gente? Havia. Juntas, começamos a procurar cursos gratuitos e a compartilhar uma com a outra todo conhecimento que, aos poucos, fomos adquirindo. A essa altura, já tínhamos certeza do que queríamos e o que parecia impossível aconteceu. A primeira oportunidade como roteiristas chegou para as duas ao mesmo tempo, no mesmo lugar. 

Sempre ouvimos que o mercado do roteiro era muito competitivo e cheio de altos e baixos. De fato é. Mas a vontade de que déssemos certo, o trabalho árduo e o impulso que uma dava para a outra foram fundamentais para não desistirmos. Hoje, sem dúvida, é muito bom olhar para o lado e ver a melhor amiga também se realizando e construindo uma carreira sólida.   

“Queremos que esse lugar onde chegamos sirva de espelho e seja também ocupado por quem se vê na gente”

“Encantado’s” é o resultado dessa nossa sintonia. A série, que nasceu na oficina para autores negros e/ ou periféricos da Globo, diz muito sobre quem nós somos e do que queremos para as nossas carreiras. Tão logo decidimos quais universos gostaríamos de explorar, entendemos que uma coisa era primordial em nosso primeiro trabalho autoral: queríamos nos ver ali. Queríamos também que o público se identificasse, se reconhecesse naqueles personagens. A partir daí, nós duas, então roteiristas iniciantes, abraçamos o desafio de, pela primeira vez, tocar um projeto e em um cenário ainda novo para ambas. Tínhamos a certeza da história que queríamos contar, mas não tínhamos ainda pleno domínio das ferramentas e das técnicas. Tanto uma quanto outra tinha acabado de chegar à empresa e este era o primeiro contato profissional com o audiovisual nessa posição de criadoras. Não sabíamos também quais obstáculos encontraríamos pela frente, mas tínhamos certeza de que, certo ou tarde, eles apareceriam. E apareceram. O que nos segurou e nos fez seguir em frente foi a certeza de um trabalho bem realizado, idealizado nos detalhes, feito com muita verdade e da vontade enorme de se estabelecer nesse mercado tão disputado.

Chegamos onde chegamos por um desejo muito grande de viver disso, de nos expressarmos através de trabalhos que mostram o modo como enxergamos o mundo e que contato queremos estabelecer com o público. Nossas carreiras são frutos de muita persistência, da confiança no nosso trabalho e da convicção de que havia um espaço a ser ocupado. Era a nossa vez de abraçar e compartilhar as nossas narrativas.  Hoje, além de nos estabilizarmos nesse lugar, queremos que ele sirva de espelho e seja também ocupado por quem se vê na gente, por quem tem origem parecida com as nossas e que, justamente por isso, não encontra um caminho tão facilitado.

O resultado do nosso trabalho é, sem dúvida, reflexo da nossa intimidade, da nossa cumplicidade de quase três décadas. Nosso processo criativo se alimenta muito disso até hoje em todo e qualquer projeto que a gente desenvolve. Nos fortalecemos como dupla de criação, sabemos quão bem funcionamos juntas, usamos nossa amizade a nosso favor, sobretudo em relação ao que ainda queremos fazer e dos novos desafios que teremos pela frente, ainda que, eventualmente, cada uma dê seus voos solo ou firme outras parcerias. Temos profunda admiração uma pela outra e sabemos bem quão longe as duas podem chegar. Esse apoio recíproco nos fortalece, nos incentiva a seguir em frente, nos desafia. E de desafio a gente, modéstia a parte, entende bem. 

Sabe aquelas amigas adolescentes que há mais de 27 anos comentavam tudo sobre televisão no telefone com fio? Hoje, elas são mais amigas do que nunca e são autoras de TV. Em algum lugar, talvez, exista uma outra dupla comentando nossos trabalhos e também sonhando em trabalhar com audiovisual algum dia.

Mais lidas

Veja também