"Mãe, roubei seu vibrador" - Mina
 
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“Mãe, roubei seu vibrador”

De objeto secreto e guardado a sete chaves à algo natural e que fica a uma gaveta de distância. O vibrador mudou de status e passou a ser uma ponte para conversas entre mães e filhas.

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Raquel* estava assistindo TV quando a filha apareceu na sala de estar, enrolada em uma toalha, com um sorriso gigante no rosto. “Mãe, tenho duas notícias para te dar; uma boa e uma ruim. A boa é a que tive meu primeiro orgasmo e a segunda é que foi graças ao seu vibrador e com isso, você acabou de perder seu brinquedinho”, ouviu da adolescente de 17 anos. 

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A mãe não teve outra opção a não ser deixar o sex toy “de presente” para a filha, que, depois de utilizar o acessório, passou por uma revolução na própria vida sexual. “Eu fiquei com medo dela achar que só conseguiria ter orgasmo sozinha, mas após utilizar o vibrador, ela me contou que conseguiu gozar com o namorado pela primeira vez e sem usar o sex toy”, conta Raquel, de 50 anos. Perdeu um de seus vibradores, mas ganhou uma filha segura e feliz.  

Este episódio – de subtração familiar de vibrador – tem sido cada vez mais comum. E para além dos risos que a situação pode arrancar, esse roubo mostra que cada vez mais mulheres se preocupam com o próprio prazer. “Quando eu tinha 16 anos, roubei o vibrador da minha mãe”, compartilha Bruna*, que hoje tem 26. 

Ela sempre fuçou os acessórios sexuais que encontrava na gaveta do quarto e, um dia, cometeu um delito. “Só depois de muitos anos ela descobriu o verdadeiro paradeiro daquele vibrador. Ainda bem que ela tinha vários”, conta rindo. Bruna garante que isso foi fundamental para seu autoconhecimento corporal.

A Revolução Industrial dos vibradores

Se há míseros 4 anos a palavra vibrador era motivo de vergonha, hoje em dia é assunto naturalizado nas mesas de bar. O brinquedinho que antes era um item secreto, e ficava muito bem escondido, atualmente fica acessível no armário do banheiro ou na gaveta da cabeceira. Além disso, é assunto corriqueiro entre parceiros, amigos e, inclusive, mães e filhas.

Muita gente não precisa nem roubar, ganha logo de presente da mãe

Tanto que muita gente não precisa nem roubar, ganha logo de presente da mãe. Como conta a professora Maria*, que decidiu presentear o filho – um adolescente transexual de 15 anos – com um vibrador. “Eu queria que ele entendesse que o prazer não depende dos outros”, diz a mãe, de 42 anos, que emenda: “acho que a gente precisa se conhecer antes de conhecer os outros, né?”.

Ela quis fazer diferente, para não repetir os erros do passado. “Sou de outra geração, nunca conversei nem sobre menstruação com minha mãe… imagina sobre sexo?”, desabafa. A professora conta que essa dificuldade de comunicação causou impactos negativos na própria vida sexual. “Não desejo o mesmo para meu filho”.

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De fato, o tema prazer e empoderamento sexual passou por uma verdadeira revolução ao longo dos anos. Primeiro, com a chegada da pílula anticoncepcional nos anos 60, na libertação reprodutiva feminina. Depois, com a normalização das relações sexuais (para além do casamento) naquilo que podemos chamar de onda “feminista pró-sexo” nos anos 80.

Já mais recentemente, o boom dos vibradores e a chegada do sexual wellness vieram para redefinir de vez o que entendemos por sexualidade (positiva) feminina. Impulsionadas pela pandemia, pelo período de isolamento e pelas redes sociais, cada vez mais mulheres resolveram conhecer e explorar o próprio corpo, descobrindo benefícios físicos, químicos e emocionais que não desaparecem após o orgasmo.

Mãe, me ajuda a escolher um vibrador?

Foi com o dinheiro que ganhou de Dia das Crianças, que Raíssa comprou o primeiro vibrador de sua vida, aos 15 anos, em 2022. Ela pediu ajuda para a mãe, Gabriela, para escolher o modelo . “Nossa relação sempre foi de muita amizade e companheirismo, sempre tivemos abertura e isso me deixa muito segura. Ela me ensinou a ter respeito com meu próprio corpo e também com o meu desejo”, relata a jovem, que hoje tem 16 anos.

“Desejo que o processo de descoberta sexual da minha filha seja mais leve do que o meu”

Apesar do autoconhecimento, Raíssa conta que nunca teve relações com penetração – e acredita que sexo não se resume a isso. Com as amigas da mesma faixa etária, conversa abertamente sobre o assunto: “Algumas tratam de maneira normal, outras ainda veem como tabu e nem conseguem tocar no assunto. O que me deixa intrigada é o fato de que a maioria normaliza a ideia de ter relações sexuais com outras pessoas, mas abomina a masturbação”.

Na casa de Gabriela e Raíssa, contudo, esse medo ficou no passado. “Hoje, percebo o quanto deixei de ter experiências sexuais boas por falta de conhecimento sobre o meu corpo. Gostaria que com ela fosse diferente. Desejo que o processo dela (de descoberta sexual) seja mais leve e satisfatório do que o meu”, resume a autônoma de 39 anos.

Qual a idade certa para o primeiro vibrador?

Não existe uma resposta exata para essa pergunta. Assim como não existe uma resposta exata para a pergunta: “Quando falar sobre sexo com meu filho?”. Já que isso depende da vivência de cada um. Como sabemos, cada pessoa inicia sua vida sexual no seu tempo. “Isso varia de caso a caso”, acredita a sexóloga Lua Menezes, que fala sobre sexualidade positiva nas redes sociais. E ela faz um alerta: antes de fazer a compra do sex toy a mãe deve bater um papo sobre masturbação com a filha.

Para puxar a conversa, Lua recomenda que a mãe parta da “própria verdade”, de forma positiva, livre de julgamentos e de preconceitos. “Vale reforçar que não existe uma maneira única e 100% correta de ter conversas como essa, sobre assuntos tabu”. Caso perceba que a filha não está aberta ao assunto, tente outro dia. “Não adianta forçar, porque isso pode soar invasivo. Acredito que compartilhar um pouco da própria experiência pode ser uma maneira legal de quebrar o gelo e de humanizar o diálogo”.

A especialista também reforça que não é saudável dividir o mesmo brinquedo sexual com outras pessoas; por isso, em casos de suspeita, aborde o assunto  “de modo menos tenso possível”, para evitar que a jovem se traumatize ou transforme a curiosidade sexual em um sentimento de vergonha. Mas diz que de maneira responsável, o apetrecho pode ser um grande aliado na relação mãe-e-filha, às vezes tão problemática na adolescência. “Conversar sobre o assunto e mostrar-se aberta é um jeito saudável de praticar comunicação não-violenta e de estreitar laços”, pontua a sexóloga.

Taí o primeiro caso de roubo em que ninguém sai perdendo. 

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