Vitórias femininas das Olimpíadas bate recorde em 2024 - Mina
 
Nosso Mundo / Reportagem

Ela ganha, eu ganho

Nessas Olimpíadas as mulheres arrasaram e não é exagero dizer que as vitórias representam muito mais do que medalhas. Um estudo mostra de onde viemos e também pra onde vamos cada vez que uma mulher sobe ao pódio

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A cada atleta feminina que subia ao pódio muitas lágrimas rolavam pelos meus olhos e também pelos olhos de muitas outras mulheres brasileiras. E não foram poucas vezes, já que saímos das Olimpíadas de Paris com 12 medalhas femininas conquistadas, dentre elas as três de ouro. E pensar que alguns desses esportes, onde hoje elas brilham, já nos foram ceifados. Ora por leis, como é o caso das lutas e do futebol, ora por uma sociedade que acha que skate e surf não são coisa de menina. Isso sem falar em modalidades onde a pele preta, diziam, não ornava – como é o caso da ginástica. 

Só pra lembrar, em 1979 as mulheres brasileiras eram proibidas de praticar futsal, futebol de praia, pólo aquático, rugby, beisebol, halterofilismo e lutas. E foi em 1996 que conquistamos nossa primeira medalha de ouro feminina, com Jacqueline e Sandra, no vôlei de praia. 

O que acontece quando temos mais espaço e mais recursos? Patrocinadores e mídia acordam para a relevância dos esportes femininos

Por isso, não é exagero dizer que a cada vitória, um portal se abre para a próxima geração de meninas, que já crescem sabendo que podem sim ser atletas olímpicas. E isso não é pouca coisa em um país onde 41% dos meninos começam a praticar esporte entre 6 e 10 anos enquanto apenas 27% das meninas começam com essa idade. 

“Se ela ganha, eu ganho” é o nome do report que a 65|10, lançou durante os jogos. Nele, mapeamos os fatores que levaram a um crescimento em investimentos, patrocínio, participação e visibilidade para os esportes femininos nos últimos anos. Chegando até esta, que foi a primeira Olimpíada com participação igualitária de homens e mulheres. 

Por mais que a gente ame as histórias de superação individuais, elas podem dar a impressão que cada atleta subiu ao pódio apenas por mérito próprio. Mas a verdade é que foi preciso um imenso esforço coletivo para que as mulheres saíssem do lugar de proibidas para se tornarem protagonistas nos esportes olímpicos em pouco mais de um século. 

Qual o segredo?

A estratégia que levou à vitória das mulheres nos esportes começou com um contexto social que pedia mais igualdade de gênero. O COI (Comitê Olímpico Internacional) respondeu a essa pressão e, em 1996, tornou a participação igualitária uma meta. Então, mudanças internas foram acontecendo no comitê, com mais mulheres ocupando espaços de liderança, e lentamente vamos ganhando posições. 

Em paralelo, temos o apoio governamental. Não se ganha medalhas sem ele e é o correto, pois o acesso à prática esportiva é um direito que, no Brasil, é garantido por lei. Nós temos o maior programa de patrocínio individual de esportistas do mundo e 44% dos contemplados em 2023 foram mulheres. Isso teve um impacto direto para que a nossa comitiva nessas olimpíadas fosse majoritariamente feminina. 

E o que acontece quando temos mais espaço e mais recursos? Patrocinadores e mídia acordam para a relevância dos esportes femininos e cria-se um ciclo virtuoso em que visibilidade chama dinheiro que chama visibilidade. E foi assim que em 2019 a final da Copa do Mundo de Futebol Feminino teve 56% mais de audiência que a edição anterior. Foi também este ciclo de investimento e visibilidade que aumentou o interesse pela Superliga de vôlei em 81% de 2022 para 2023. 

De protesto em protesto

Mas o golpe de mestre disso tudo são elas, as atletas. Talvez por estarem mais acostumadas a trabalhar em equipe, elas se organizam continuamente para demandar direitos e acessar recursos e, de processo em processo, de protesto em protesto, vão levando suas categorias adiante.

É claro que ainda há muito a conquistar: as atletas ainda ganham menos que seus pares homens, têm menos tempo de cobertura no noticiário esportivo, estão menos presentes em cargos de liderança e ainda têm que lidar com diferentes tipos de assédio e discriminação. Além disso, as meninas ainda não são tão incentivadas a praticar esportes quanto os meninos. 

Mas o que temos certeza é que quando uma bolha é furada, muda tudo. Os dados do “efeito Karen Jonz” não nos deixam mentir: o número de skatistas mulheres subiu de 10% em 2009 para 19% em 2015, nesse intervalo vimos Karen ser tetracampeã mundial e se tornar a primeira mulher brasileira campeã mundial de skate vertical. Quando Rayssa Leal levou a prata em Tokyo, demos mais alguns passos. E é por isso que a celebração das conquistas femininas nas Olimpíadas de Paris merecem comemoração dupla, tanto pelas emocionantes vitórias como pelo efeito que, temos certeza, elas causam por aqui.  

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