Amanda Guimarães Borges, ou simplesmente Mandy Candy como é conhecida na internet, tem 33 anos e é criadora de conteúdo, empresária e mulher transgênero. A história de Mandy começa num corpo masculino e traz uma jornada de autoconhecimento e aceitação. Mas nesse percurso, não faltaram dismorfia, transfobia e opinião alheia. Hoje, Mandy está confortável em si mesma e trabalha para inspirar outras pessoas. “Foi trocando com outras mulheres que eu comecei a aceitar que não preciso ser magra, estar maquiada ou ter o cabelo liso para ser mulher. Aliás, eu já era uma mulher antes mesmo da minha transição”.
Bora nesse passeio pela vida e questões de Mandy?
“Sofria de pensar que ia envelhecer menino”
Quando criança, Mandy sofria de disforia de gênero, ou seja, se identificava com o gênero oposto. “Eu me olhava no espelho e não me encontrava. Tinha várias crises por não saber como seria o meu futuro. Sofria ao pensar que iria envelhecer ‘sendo um menino’. Naquela época ninguém falava sobre pessoas trans e eu ficava pensando ‘cara, o que eu sou?'”. Ela conta que antes da transição era tudo complicado. Mal conseguia ir ao banheiro, olhar para baixo.
“Ter transicionado salvou a minha vida”
A primeira sensação de libertação veio aos 18 anos, quando deu início ao processo de transição de gênero. “Ter transicionado salvou a minha vida porque hoje consigo me ver com 90 anos: toda cheia de plásticas, bem louca e toda vestida toda de rosa”, ela se diverte. Mandy conta que na época trabalhava em telemarketing e teve apoio da mãe. Guardava todo o seu salário para pagar a cirurgia e as consultas com uma psicóloga para ter o laudo que possibilitasse o tratamento hormonal.
“O médico ele falou que era muito masculina”
Alguns anos depois do início da transição, aos 24 anos, Mandy se mudou para a Coréia do Sul. Na época, sofreu muito com uma pressão por um “corpo ideal”, sobretudo por não possuir informações ou uma boa rede de apoio. Ela conta que na Coréia do Sul se não fosse muito magra, não era considerada bonita. “Fui muito influenciada pela cultura coreana e pelo padrão de beleza de lá, que é ter o rosto bem fininho. Então fazia procedimento todo mês. Não me arrependo, mas se tivesse a cabeça que tenho agora, não sei se teria feito. Eu gostava do meu rosto, mas quando fui no médico ele falou que era muito masculino, que meu queixo isso, minha testa aquilo, me deixei levar”.
Mandy lembra que, nessa época, foi um grupo no Orkut que trouxe informação e inspiração: “Era um grupo só de meninas trans e foi bem legal porque funcionava como um blog onde a gente compartilhava nossos sentimentos”.
“Odeio a palavra ‘passabilidade'”
Essa foto, nos bastidores do seu programa no Youtube Mandy me transforma, marca uma fase em que Mandy se exigia demais. Achava que deveria estar sempre maquiada e com os cabelos lisos. “Muita gente comentava que eu ficava mais feminina com o cabelo liso. É complicado ouvir isso, sabe?”. E assim, Mandy viveu parte de sua vida montada. Ela conta que a questão da passabilidade (quando uma mulher transgênero se parece e se passa por uma mulher cisgênero) era muito sensível para ela na época. Se sentia invalidada se não estivesse “perfeitinha”, como ela mesma diz. E aqui ela faz um aparte: “Odeio essa palavra ‘passabilidade’. É como se fosse obrigatório que ninguém note que você é trans”.
“Vivemos em um mundo que não deixa a gente se aceitar”
Essa foto, em que Mandy mostra sua barriga com um sorriso no rosto, é o melhor exemplo do processo de aceitação pelo qual vem passando nos últimos anos. Quando morava na Ásia, Mandy conta que pesava 52 quilos e chegou a abrir mão de muita coisa para ser magra como achava que deveria. “Deixava de comer, de sair com meus amigos e de aproveitar muita coisa. Deixei de registrar momentos maravilhosos em viagens por vergonha do corpo que eu tinha! Isso é algo que nunca mais vou deixar acontecer”.
O padrão ainda manda um alo, e ela puxa isso pra si: “Não vou dizer que me aceito 100%, até porque vivemos em um mundo que não deixa a gente ser assim, né? Mas perdi muitos anos da minha vida porque ainda não tinha me encontrado como Amanda. Cheguei a conclusão que não quero perder mais nada!”. O processo, claro, não aconteceu de uma hora para a outra, mas o contato com mulheres, como Alexandra Gurgel, do Movimento Corpo Livre, foi essencial. “Hoje, sempre me pergunto se estou fazendo alguma coisa porque quero ou porque os outros querem. Isso me ajuda demais”.