Glicose é o novo glúten? - Mina
 
Seu Corpo / Reportagem

Glicose é o novo glúten?

Esse monitoramento pode ajudar a criar um estilo de vida mais saudável. Mas nem pense em sair correndo para comprar o aparelho.

Por:
5 minutos |

Até pouco tempo atrás, glicose era assunto para os diabéticos. Agora, virou o vilão do público que deseja um estilo de vida saudável. É cada vez mais comum ver aparelhos de monitoramento contínuo de glicose (CGM) como acessório de quem busca rastrear com mais precisão a saúde. Mas da onde será que vem esse hype?

Para Alessandra Rascovski, doutora em Endocrinologia pela USP, três fatores ajudam a explicar essa onda: controle de peso, performance esportiva e conhecimento sobre o funcionamento do próprio corpo. E o que as pessoas buscam é precisão: “Alimentos com índice glicêmico baixo tendem a manter a sensação de saciedade por mais tempo, o que pode ajudar a reduzir a ingestão calórica total. Conhecer o pico glicêmico permite escolher melhor os alimentos que fornecem energia sustentada durante os treinos”, diz. Existe um IG esperado para cada alimento, mas a médica frisa que como ele varia de  pessoa pra pessoa, esse controle ajuda a trazer uma precisão.

Quem também contribuiu muito para deixar o tema em alta foi a bioquímica francesa Jessie Inchauspé, autora do livro “A revolução da glicose” (editora Objetiva). Em sua conta no Instagram ela compartilha com seus mais de 4 milhões de seguidores gráficos mostrando como sua glicemia aumenta após diferentes refeições. Embora esse seja um movimento natural que acontece quando a glicose se acumula na corrente sanguínea, grandes picos de glicemia com frequência são prejudiciais.

No curto prazo, flutuações muito severas podem resultar em fadiga, irritabilidade, dificuldade de concentração, fome constante e desejo por doces. Já no longo prazo, você pode acabar com inflamação crônica, uma das principais causas de doenças como derrame, doença cardíaca, doença hepática e diabetes tipo 2. Segundo a Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica), a glicemia é considerada normal quando apresenta os seguintes valores: em jejum (após 8 horas ou mais sem comer) – entre 70 a 99 mg/dL e pós-prandial (após refeições, geralmente com o intervalo de duas horas) – até 140 mg/dL. 

Faz sentido usar um CGM?

Mas será que comprar um monitor de glicose é mesmo necessário ou apenas um modismo? Segundo Alessandra, essa é uma opção interessante para mudança de estilo de vida, mas não precisa ser necessariamente um monitoramento contínuo. “Na minha prática, utilizamos a ferramenta para ajudar a pessoa a entender sua variabilidade de glicemia em tempo real e então fazermos as adaptações alimentares e de atividade física”, conta. Ela também afirma que monitorar os níveis de glicose contribui na identificação de tendências que podem levar a condições como diabetes tipo 2, permitindo uma intervenção precoce.

No entanto, há a possibilidade de que o acesso a “muitos dados” leve à sobrecarga de informações, alarmes falsos, ansiedade desnecessária ou má interpretação. Além disso, em pessoas saudáveis, os monitores de glicose podem não ser tão precisos quanto em diabéticos, especialmente em níveis de glicose normais e situações de hiperglicemia. “O monitoramento constante pode desencadear preocupações excessivas com níveis normais de glicose, que são flutuantes por natureza. Também é preciso saber interpretar os dados corretamente e ajustar comportamentos de acordo. Ou seja, o benefício existe quando há acompanhamento profissional”, enfatiza a especialista. 

Como achatar a curva

De acordo com a endocrinologista Patrícia Moreira Gomes, diretora da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo – SBEM-SP, há algumas estratégias simples e universais que podem controlar os níveis de glicose no sangue de forma eficaz e sustentável.

A primeira dica é que a ordem do que comemos importa e devemos optar por consumir fibras e proteínas antes dos carboidratos. Se for comer um prato com massa e brócolis, por exemplo, começar pelo vegetal é o ideal. Isso porque as fibras retardam a digestão e a absorção de carboidratos, ajudando a manter níveis de glicose estáveis. O mesmo acontece com gorduras, como castanhas e abacate, e vale adicioná-las no cardápio. 

Movimentar o corpo depois das refeições também pode ser útil. Uma caminhada leve de 10 minutos já é o suficiente para fazer com que a glicose que acabou de ingerir vá para os músculos em vez de criar um pico. Caso não tenha essa possibilidade, alguns agachamentos, flexões e até dançar sua música preferida funcionam. O importante é mexer o corpo. 

Outras maneiras de controlar o açúcar no sangue incluem a velha e boa redução do açúcar adicionado à dieta, a escolha por alimentos com baixo índice glicêmico, como legumes, grãos integrais e vegetais, e evitar o exagero de carboidratos refinados – aqueles que no processo industrial tiveram as fibras, proteínas, vitaminas retiradas.

Mas vale lembrar que, embora tenha uma grande influência, a comida não é o único gatilho que pode afetar o açúcar no sangue. “Ter uma rotina regular de exercícios, controlar o estresse, manter-se hidratado e dormir bem são outros fatores que podem impactar nos níveis de glicose”, completa a nutróloga Marcella Garcez, mestre em Ciências da Saúde pela PUCPR e docente da Associação Brasileira de Nutrologia.

Mais lidas

Veja também