Rebeca Andrade fala da pressão nas Olimpíadas - Mina
 
Suas Emoções / Entrevista

Rebeca Andrade: “Não posso prometer o que está fora do meu controle”

Diretamente de Paris a ginasta conta como está lidando com a pressão e porque quase desistiu da carreira

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Rebeca Andrade foi a primeira brasileira a subir ao pódio na ginástica artística em uma Olimpíada. Em Tóquio, em 2020, conquistou duas medalhas e manteve o ritmo tanto no mundial, como nos Jogos Pan-Americanos de Santiago. Não é à toa que ela é hoje o principal nome brasileiro da modalidade, o que, como ela mesma diz, vem com uma boa dose de pressão.

Em entrevista a Mina, a atleta alega estar tranquila, mas não esconde o receio perante as expectativas altas. Com estreia prevista para a madrugada de domingo, ela assume a ansiedade e garante: “Estou focada e concentrada. Preciso ficar calma para que tudo saia bem”, diz.

“Sinto que amadureci como pessoa e como atleta, mas por dentro, é como se nada tivesse mudado”

Três anos separam Tóquio de Paris e a atleta diz ser “a mesma Rebeca”. O que mudou, conta, foi do ginásio para fora. “Sou a mesma pessoa, e não coloco pressão em mim mesma. Sei que muita gente está torcendo por mim, por medalhas, e sinto esse carinho. Meu objetivo é brigar por resultado, mas não posso prometer o que está fora do meu controle. O que posso prometer é que farei meu máximo, darei meu melhor. Treinei muito e estou preparada”, diz.   

A expectativa tem fundamento: nas Olimpíadas passadas, Rebeca foi prata no individual geral, atrás apenas da americana Sunisa Lee. Seu salto levou o Brasil ao ouro e em 2023, no mundial de ginástica, ela desbancou Simone Biles e repetiu o feito. 

Sendo o salto o lugar seguro de Rebeca, COB e ginástica se desentenderam pouco antes dos Jogos deste ano. O comitê olímpico divulgou um vídeo em que a ginasta treinava um salto inédito para as Olimpíadas. Questionada sobre o vazamento de seu salto-chave, ela preferiu não comentar.

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Nos Jogos Pan-Americanos de Santiago, Rebeca também levou seu salto ‘cheng’ ao lugar mais alto do pódio, e ficou com a prata nas barras assimétricas. Ela conta que executou tantas vezes aquele salto que não consegue nem enumerar. Mas que, ao pisar os pés no chão depois de voar em Santiago, não teve dúvidas da perfeição com a qual havia executado: “Cravei”, pensou. 

“Desde 2012, quando rolaram as Olimpíadas de Tóquio, muita coisa aconteceu. Tiveram outras competições, o PAN. Mas eu não mudei. Sigo uma mulher bem resolvida e feliz, com meus objetivos. É claro que mais madura, porque o tempo faz isso. Nos faz ver as coisas com outro olhar, outra perspectiva. Sinto que amadureci como pessoa e como atleta, mas por dentro, é como se nada tivesse mudado”, ela diz.

Tóquio foi divisor de águas

Rebeca relembra como se sentiu depois de ter apresentado seu baile de favela ao mundo em Tóquio. A repercussão de suas apresentações foi global, mas ela afirma que a ficha das conquistas só caiu quando voltou para casa. “Os jogos de Tóquio aconteceram durante a pandemia, sem torcida, sem contato com as pessoas. Então, eu não tinha noção da dimensão que aquilo tomou. Quando cheguei ao Brasil, fui inundada por mensagens de carinho dos fãs, pela torcida, e a forma como passei a ser reconhecida me fez começar a entender o tamanho daquelas conquistas”, conta.

E ela faz questão de frisar: “Foram conquistas coletivas. Cada medalha que recebo tem um pedaço da equipe, de profissionais que trabalham comigo, de fãs, parceiros e da minha família, que esteve ao meu lado em todos os momentos.”

A família, tudo por ela

A família sempre foi o alicerce de Rebeca no esporte. Foi a tia que levou a menina de apenas cinco anos para fazer um teste, realizado pela prefeitura de Guarulhos, região metropolitana de São Paulo. “Para mim, era uma brincadeira. Me diverti e passei no teste”, lembra.

Como o ginásio ficava longe da casa, começaram os malabarismos para que Rebeca pudesse comparecer aos treinos. A mãe, empregada doméstica, começou a ir ao trabalho a pé, e o dinheiro que recebia para pagar a passagem de ônibus destinava ao transporte da filha. “Só que com o tempo, minha mãe começou a ficar muito cansada. Então, meu irmão passou a vender latinhas e, com o dinheiro, comprou uma bicicleta usada. Minha mãe voltou a ir ao trabalho de ônibus, e meu irmão me levava todos os dias para o ginásio de bicicleta”, diz Rebeca. 

“Enfrentamos muitas dificuldades financeiras, e toda minha família precisou se esforçar para eu realizar esse sonho”

“Nós enfrentamos muita dificuldade financeira, e toda minha família precisou se esforçar muito para que eu conseguisse realizar esse sonho. Minha mãe trabalhava demais para que não faltasse nada em casa, e tinha o apoio dos meus irmãos e tias. Se não fosse por eles, eu com certeza não teria seguido no esporte e realizado meus sonhos”, conta.

E como a vida dos atletas nunca é simples, depois das vitórias vieram outras dificuldades. Não mais financeiras, mas agora são sinais do corpo exausto que às vezes batem à porta. Rebeca atribui às lesões as causas de seus maiores sentimentos de angústia enquanto atleta: “É um sentimento de incerteza, de dúvida. A gente não sabe o tamanho do problema, nem se vai conseguir sair dele igual estava antes. É preciso estar muito forte emocionalmente para lidar com esse tipo de situação”.

“Durante essas lesões, já pensei muitas vezes em desistir. A primeira foi um baque. A segunda mexeu muito comigo. Mas a terceira foi a que me fez achar que o esporte havia acabado para mim. Por sorte, eu sempre tive uma rede de apoio muito forte, que me fez seguir em frente. Mas não foi fácil. Na terceira lesão, liguei para a minha mãe, pedi que ela me buscasse e falei para o Xico [técnico de Rebeca] que não queria mais competir. Mas segui. Não desisti do meu sonho porque pessoas importantes estavam ali sonhando junto comigo.”

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