Daiane dos Santos: "Eu sou linda e meu cabelo crespo é lindo" - Mina
 
Seu Corpo / Arquivo Pessoal

Daiane dos Santos: “Eu sou linda e meu cabelo crespo é lindo”

Uma das maiores atletas brasileiras, Daiane dos Santos fez história na ginástica artística brasileira. Aposentada, ela conta como foi sua relação com o corpo nos tempos de competição e quais têm sido as descobertas depois que se aposentou

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Da periferia de Porto Alegre para ser uma das maiores e mais importantes atletas do Brasil. Daiane do Santos fez história na ginástica artística brasileira e coleciona medalhas internacionais, incluindo um ouro no Campeonato Mundial de 2003 – a primeira brasileira entre homens e mulheres. Negra e periférica, ela não imaginava que o esporte, que encarava como um hobby, poderia render uma carreira de sucesso. “Foi cansativo, mas valeu a pena”, relembra.   A seguir, a gaúcha que brilhou no solo ao som de brasileirinho e hoje com 39 anos, compartilha capítulos da sua história, incluindo a autoestima bem alimentada pelos pais, a acusação de doping quando estava afastada da seleção e a vontade de assumir os cachos após a aposentadoria no esporte.

Daiane dos Santos
Daiane iniciava sua carreira na ginástica/Arquivo Pessoal

“Aos 13 anos, uma professora me convidou para fazer ginástica. Fiquei curiosa e fui”

A infância da Daiane foi de brincadeiras, se sujar e viver descabelada como ela mesma gosta de lembrar. “Era muito bagunceira e hiperativa.” O que tirava um pouco o sossego da mãe, que amava cuidar do cabelo das filhas e elogiar sua beleza e de seus irmãos. “Meus pais sempre reafirmavam nossa beleza. Regavam a nossa autoestima mesmo”. O fato de ser baixinha não a preocupava, sempre levou as piadinhas na brincadeira. Mal sabia ela que isso seria fundamental para a carreira., que aliás, começou em um parquinho quando uma professora identificou ali um talento. “Ela se chamava Cleusa de Paula e me convidou para fazer ginástica, fiquei curiosa e fui.” A partir daí, a gaúcha não largou mais os ginásios. 

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Daiane dos Santos
Ainda na adolescência, a ex-atleta conciliava os treinos e vida pessoal/ Arquivo Pessoal

“Tinha muita massa muscular. As pessoas diziam que eu ficaria grande”

Aos 16 anos, Daiane já era um destaque na ginástica. Em 1999 participou do Pan Americano de Winnipeg e conquistou medalhas, mas como na época, a prática esportiva ainda não era vista por ela como profissão, havia sempre um questionamento rondando – mundo do esporte e seus patrocínios mudaram muito de lá pra cá. Nessa época,ficar longe da família foi sofrido: “Tive essa dupla jornada e, infelizmente, a parte da família sofreu um pouco.” Foi aí também que começaram os comentários mais intrometidos sobre seu corpo. “Eu tinha muita massa muscular, peitos e bumbum aparentes e as pessoas diziam que eu ia ficar grande demais, porque as ginastas eram magrinhas, sem peito. Mas depois ficou tudo compacto.” 

Daiane dos Santos
A gaúcha ganhou ouro no Campeonato Mundial de 2003/ Arquivo Pessoal

“Eu não queria deixar minha vaga para outra pessoa” 

Um pouco antes de fazer história e conquistar a medalha de ouro do Campeonato Mundial de Ginástica Artística, Daiane viveu um drama que já assombrou muitos atletas: a gaúcha passava por uma lesão no joelho. Seu pós-operatório foi em tempo recorde, e em dois meses ela estava pronta para brilhar no solo e levar a medalha. “Eu não queria deixar minha vaga para outra pessoa, e sabia o preço que tinha que pagar. Foi cansativo, mas valeu a pena”, diz. A conquista que alegrou os brasileiros foi marcada pela representatividade. “Em um esporte completamente aquém do que as pessoas esperam de uma pessoa negra, essa conquista tem um valor a mais.”

“Testei positivo no doping e me arrependo do procedimento estético.”

Em 2009, após uma nova cirurgia no mesmo joelho, Daiane estava afastada dos treinos e das competições para se recuperar. Foi aí que, para se sentir bem, resolveu fazer uma intervenção estética para se livrar da gordura localizada no abdômen. Sempre vaidosa, não era a primeira vez que recorria a procedimentos do tipo. Só que dessa vez, foi utilizado uma substância diurética, proibida pela Federação Internacional de Ginástica. “Testei positivo no doping e me arrependo de ter feito o procedimento estético, de não saber o que estava sendo injetado no meu corpo.” Bastante repercutido nos jornais na época e com uma punição de cinco meses,  Daiane comenta que o episódio serviu como um alerta. “Quando você é um atleta, não é uma pessoa normal, tem que ter cuidado com que come ou bebe. O nosso trabalho depende do corpo.” 

Daiane dos Santos
Aposentada, ela assumiu outros projetos voltado para o esporte/ Gustavo Pitta

“Agora estou entendendo como meu corpo funciona fora do esporte.”

Daiane se aposentou aos 33 anos e decidiu olhar para si e tocar projetos pessoais. Entre eles, fundou o projeto Brasileirinhos, que atende crianças de 6 a 17 anos no Centro Educacional de Paraisópolis e Aricadanduva e tem o apoio da prefeitura de São Paulo. Fora das competições, a gaúcha passou a entender melhor como era seu corpo, que não era mais de atleta e que tinha novas ambições. “Agora sou uma pessoal normal, e estou entendendo como meu corpo funciona fora do esporte”. Só agora, também, Daiane resolveu deixar seus cabelos naturais. “Antes de parar de treinar, comecei minha transição capilar, mas foi só depois de me aposentar que voltei pro meu cabelo natural. Eu sou linda e meu cabelo crespo é lindo.”

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